agosto 2014
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quinta-feira, 28 de agosto de 2014

A HIPÓTESE DE UMA ORTOGRAFIA DO PORTUGUÊS DE ANGOLA

A HIPÓTESE DE UMA ORTOGRAFIA DO PORTUGUÊS DE ANGOLA


Por Wa Zani

27 de Agosto, 2014

Em cada computador aparecem várias opções para a ortografia do inglês (África do Sul, Austrália, Belize, Canadá, Caraíbas, Estados Unidos, Índia, Indonésia, Irlanda, Jamaica, Malásia, Nova Zelandia, R.A, de Hong Kong, Reino Unido, Singapura, Trinidade e Tobago, Zimbabwe) e também para a ortografia do francês (Bélgica, Camarões, Canadá, Costa do Marfim, Haiti, Índias ocidentais, Luxemburgo, Mali, Maurícias…). Em relação à Língua Portuguesa, há ainda as opções do português de Portugal e do Brasil, apesar de nos aparecer, após o AO90, palavras sublinhadas a vermelho no nosso computador, como se estivessem erradas, apesar das duas normas ortográficas (a velha e a nova) estarem ainda em vigor. Nos cinco PALOP, a norma do português era a do português de Portugal, que decidiu afastar-se para uma outra ortografia mais próxima do português do Brasil. A 10 de Agosto de 1945, o Brasil assinou com Portugal a “Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945” e há 70 anos que não a cumpre. No actual contexto do AO90, o Brasil salvaguardou antecipadamente as questões culturais de ordem ortográfica do “tupi-guarani” e nós angolanos, preocupamo-nos em salvaguardar o nosso património linguístico bantu, principal vertente cultural da nossa identidade, cuja estrutura difere bastante da linguística neolatina.

O reconhecimento da fragilidade do texto do AO90 é praticamente consensual e há cidadãos dos países da CPLP, que, por falta de um prontuário ortográfico que lhes sirva de referência, misturam as duas ortografias, incluindo os próprios professores. O que se pressupunha que iria unir a grafia em português, nunca se irá concretizar, tal como a maior difusão internacional da Língua Portuguesa e uma maior facilidade da aprendizagem para o próprio idioma. Para que serviu afinal o Acordo Ortográfico?

O Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), a ser realizado a partir dos Vocabulários Ortográficos Nacionais (VON), só faria sentido, se fossem elaborados de forma ampla e multissectorial. Mas como isto leva algum tempo, não está a ser feito na grande maioria dos países.

Em 30 de Março de 2012, em Luanda, a VII reunião dos Ministros da Educação da CPLP reconheceu que “a aplicação do AO de 1990 no processo de ensino e aprendizagem revelou a existência de constrangimentos” e decidiu proceder a “um diagnóstico relativo aos constrangimentos e estrangulamentos na aplicação do AO de 1990” e sugeriu “acções conducentes à apresentação de uma proposta de ajustamento do AO de 1990, na sequência da apresentação do referido diagnóstico.” A VIII Reunião dos Ministros da Cultura da CPLP, realizada, também em Luanda, nos dia 2 e 3 de Abril de 2012, decidiu “apoiar a Declaração Final da VII Reunião dos Ministros da Educação da CPLP sobre o Acordo Ortográfico”.

A 17 de Abril de 2014, a VIII Reunião dos Ministros da Educação, realizada em Maputo, decidiu “instar o Conselho Científico do IILP, através do Secretariado Executivo da CPLP, a incluir na agenda da sua próxima reunião os seguintes pontos, para análise e pronunciamento: “Parecer oficial sobre o Acordo Ortográfico de 1990, apresentado por Angola; Diagnóstico relativo aos constrangimentos e estrangulamentos na aplicação do Acordo Ortográfico de Língua Portuguesa de 1990; Acções conducentes a apresentação de propostas de ajustamento do Acordo Ortográfico de 1990, na sequência da apresentação do referido diagnóstico”.

Os sócios do PEN Clube Português, reunidos em Assembleia Geral no dia 18 de Março de 2013, “defendem a necessidade de suspensão imediata da aplicação do AO, a fim de que possa ser retomada uma discussão pública séria sobre um assunto que não pertence ao foro político nem económico mas linguístico e cultural; consideram que, tal como os autores dos pareceres qualificados sobre o Acordo, que em 2008 foram completamente ignorados e cuja opinião deve ser tomada em consideração, também os escritores, que trabalham com a matéria-prima da língua e que na sua grande maioria sofrem com os resultados da amputação das raízes em muitas palavras, tornando estas irreconhecíveis, têm que ser ouvidos, quer individualmente, quer através das organizações que integram, como a Associação Portuguesa de Escritores (APE), o PEN Clube Português e a Sociedade Portuguesa de Autores (SPA)”.

No portal do Senado Brasileiro, foi, no dia 1 de Outubro de 2013, dada a conhecer a constituição de um Grupo de Trabalho com a seguinte informação: “O grupo terá a participação dos professores Ernâni Pimentel e Pasquale Cipro Neto”. O AO90 colhe reservas no Senado, existindo o desejo expresso de pôr em questão o AO90, e a missão deste Grupo “é contribuir para que o país tenha uma proposta para simplificar e aperfeiçoar o acordo. A ideia é fazer com que o grupo trabalhe com especialistas de outros países de língua portuguesa.”

Pelos vistos, mesmo a nível oficial, há posições muito divergentes, quer em Portugal como no Brasil. Os Ministérios da Educação e da Cultura pronunciam-se de um forma e os Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Relações Exteriores influenciam os seus subordinados mais directos de outra forma. Mas, não há nada pior do que ter um Acordo aprovado por decreto e não por consenso. Ou melhor, nada pior que um Acordo político para as questões de uma língua que é património comum da humanidade. Fugir para a frente parece ser o melhor caminho para salvar as editoras brasileiras e portuguesas, que se anteciparam antes do tempo e agora dizem que os constrangimentos são de pouca monta. Quem terá feito esse diagnóstico?

Os PALOP, cujo parque editorial depende das importações dos países que já admitem que o texto do Acordo é fraco e que há erros e aporias, só teriam a ganhar com a revisão do AO90, pois quando se adere ao que, à partida, está mal, corremos o risco de termos de mudar tudo outra vez daqui a uns anos e são sempre os mesmos a vender e os mesmos a importar, de acordo com o ambiente económico de conveniência.

Será que a nós nos interessa, do ponto de vista patrimonial, a glotofagia da Língua Portuguesa, no momento em que já conhecemos a Declaração Universal dos Direitos Linguísticos?

[Transcrição integral de artigo publicado no "Jornal de Angola" em 27.08.14.

A VERDADE CHOCANTE DO MH17 ABATIDO NA UCRÂNIA ANALISADA COMPLETAMENTE PELO CORBERTT REPORT



O caso do avião MH17 das linhas aéreas da Malásia está ainda envolvido em mistérios e informações que foram entretanto classificadas como confidenciais, mas sobretudo existe uma enorme desinformação feita pela média ocidental e pelo governo dos EUA e NATO que acusou os russos de terem sido os responsáveis pelo abate do avião. Conheça muita da verdade neste vídeo exposta aqui pelo Cobertt Report.



Voo MH-17 enquanto voava sobre a Polónia, de Amesterdão a Kuala Lumpur, a12 de Abril de 2012


Havia um avião das forças aéreas ucranianas, um SU-25 à mesma altitude e na mesma zona e ao mesmo tempo que o MH17


Buracos de balas duma rajada de metralhadora no cockpit do MH17
O MH17 mudou a sua rota para uma zona de guerra, porquê ?
Caixas negras do MH17

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

A DESTRUIÇÃO DA LÍBIA É UM AVISO PARA O EGIPTO, SÍRIA E UCRÂNIA

A DESTRUIÇÃO DA LÍBIA É UM AVISO PARA O EGIPTO, SÍRIA E UCRÂNIA

EAU & Egipto supostamente por de atrás de ataques aéreos à Líbia: "Há um motivo político"


Na Líbia, a NATO efectivamente desorganizou e destruiu uma nação inteira. A acção da NATO na Líbia reduziu o país a pilhas de ruínas fumegantes, para que empresas ocidentais possam, não só pilhar os recursos nacionais, mas, também, usar o ‘modelo líbio’ com o padrão para futura acção extraterritorial na Síria, Egipto, Ucrânia e agora novamente no Iraque.


Por Tony Cartalucci, New Eastern Outlook (NEO)


“A Líbia está a considerar um deslocamento de forças internacionais para restabelecer a segurança, agora que a violência recomeçou em Tripoli, e dezenas de foguetes destruíram a quase toda a frota de aviação civil naquele aeroporto internacional.

‘O governo analisa a possibilidade de solicitar que forças internacionais sejam enviadas para actuar em solo, restabelecer a segurança, e ajudar o governo a impor a sua autoridade’ – disse um porta-voz do governo na Líbia, Ahmed Lamine, em declaração.”

 OS "PROXIES" DA NATO CANIBALIZAM-SE ENTRE SI

Milícia de Misrata toma e incendeia o aeroporto internacional de Trípoli, na Líbia

Em maio de 2014, a luta na cidade de Benghazi no leste da Líbia já deixara incontáveis mortos, muitos e muitos feridos e legiões de moradores obrigados a abandonar as próprias casas para não morrer, quando um “general renegado” fazia guerra contra “militantes islamistas” dentro da cidade. Num artigo intitulado “Famílias evacuam Benghazi, e general renegado ameaça com novos ataques“, a agência Reuters escreveu:

O auto-declarado Exército Nacional Líbio, liderado por um general renegado, disse a civis no sábado que abandonassem bairros de Benghazi antes de ele iniciar ali mais um ataque contra militantes islamistas, um dia depois de ali ter havido dezenas de mortos, nos mais violentos confrontos na cidade em meses.

O general renegado é Khalifa Haftar (às vezes também referido como “Hifter”), que morou durante anos nos EUA, nos arredores de Langley Virginia, ao que se crê sendo treinado pela CIA, até que retornou à Líbia em 2011 para comandar as forças de invasão da NATO. Num artigo de 2011, o Business Insider informava:  “O general Khalifa Hifter é o homem da CIA na Líbia?“:

"Desde que chegou aos EUA, no início dos anos 1990s, Hifter morou no subúrbio de Virginia, próximo de Washington, DC. Badr disse que nunca entendeu exactamente o que Hifter fazia para viver, e que a principal preocupação de Hifter sempre fora ajudar a sua grande família.

Quer dizer: trata-se de um ex-general de Kaddafi, que muda de lado e passa a trabalhar assumidamente para os EUA, instala-se na Virginia nos arredores de Washington, D.C. e consegue apoiar a própria grande família na Líbia, de modo que alguém que o conheceu ao longo de toda a vida diz que ‘nunca o entendeu exactamente ? Hmm.

É altíssima a probabilidade de que Hifter tenha sido comprado para trabalhar a favor dos EUA. Assim como figuras como Ahmed Chalabi foram ‘cultivadas’ para um Iraque pós-Saddam, Hifter pode perfeitamente ter desempenhado um papel semelhante como activo da inteligência dos EUA, à espera de um momento para agir na Líbia."

A ironia desse ‘arranjo’ é que muitos dos guerrelheiros sectários contra os quais Hafter está em luta em Benghazi são os mesmos guerrilheiros contra os quais Muammar Kaddafi se opôs ao longo de décadas como líder da Líbia; e são os mesmos guerrilheiros que a NATO armou e organizou, com Hafter, para induzir a queda de Kaddafi em 2011.

Sobre sua própria guerra em Benghazi,  Hafter disse que ela continuará “até que não reste nenhum terrorista em Benghazi”; e que “começamos essa batalha, que prosseguirá até alcançarmos os nossos objectivos. A rua e o povo líbio estão do nosso lado.” Os sentimentos de Hafter fazem perfeito eco ao que dizia Muammar Kaddafi em 2011. De diferente, só, que a imprensa ocidental negou, ao longo de décadas, que houvesse qualquer terrorista em Benghazi; e sempre apresentou as operações de Kaddafi em Trípoli como “massacre” de “pacíficos manifestantes pró-democracia.”

 A NATO DESTRUIU A LÍBIA

 


As mesmas atrocidades que a NATO listou, de início, como ‘causa’ para a sua “intervenção humanitária” na Líbia, imediatamente passaram a aparecer como práticas da própria NATO e das forças que a NATO ou mantém. Cidades inteiras foram cercadas levadas à fome, e bombardeadas por ar até capitularem. Em outras cidades, populações inteiras foram, ou exterminadas ou evacuadas ou em alguns casos, ‘empurradas’ para fora das fronteiras líbias. A cidade de Tawarga, onde viviam cerca de 10 mil líbios, foi totalmente destruída, a ponto de o London Telegraph referir-se a ela hoje como “cidade fantasma”.

Desde a queda de Tripoli, Sirte, e de outras cidades líbias que resistiram à invasão dos proxies da NATO, pouco sobrou em termos de estabilidade básica, muito menos da prometida "revolução democrática" da NATO e dos seus colaboradores que voltaram para a Líbia. O governo em Tripoli continua num caos, as forças de segurança divididos entre si, e agora um "rogue" agente da CIA está a realizar uma operação militar em larga escala contra Benghazi, incluindo o uso de aeronaves militares, aparentemente sem a aprovação de Trípoli.

Anos depois da conclusão da dita ‘revolução’, a Líbia continua sua trajectória forçada na direcção do mais completo atraso. As grandes realizações do governo de Muammar Kaddafi já foram desmontadas há muito tempo e é pouco provável que venham a ser restauradas, e muito menos resolvidas num em futuro previsível. A NATO efectivamente desorganizou e destruiu uma nação inteira, deixando-a não só a arder enquanto as corporações ocidentais saqueiam os seus recursos, mas também para ser usada como um modelo para futuras aventuras extra-territoriais na Síria, Egipto, Ucrânia, e agora o Iraque.

O MODELO LÍBIO: EGIPTO, SÍRIA, UCRÂNIA CUIDADO



Tal como foi feito na Líbia, também se tentou fazer ‘revoluções’ semelhantes no Egipto, na Síria e na Ucrânia. As mesmas narrativas, palavra a palavra, inventadas nos think-tanks políticos; nas redações da imprensa; e nas ‘análises’ dos especialistas acadêmicos ocidentais, para a Líbia, estão sendo agora reutilizadas para o Egipto, Síria e Ucrânia. As mesmas organizações não-governamentais (ONGs) estão a ser usadas como meio para fazer chegar dinheiro, equipamento e outras modalidades de apoio aos grupos de oposição, em cada um desses países. Termos como “democracia”, “progresso”, “liberdade” e luta contra a "ditadura” são frequentes. Não houve protestos que não tenha sido acompanhados por guerrilheiros armados e sempre, apoiados pelo Ocidente.

Na Síria, os protestos foram instrumentalizados e vendidos como acção de “combatentes da liberdade”. Os media ocidentais consomem agora muito do seu tempo, spinning and justifying why NATO and its regional partners are funding and arming sectarian militants inclusive a Al Qaeda, para que tentem derrubar o governo sírio.

No Egito, ainda há alguma ambiguidade, tal como houve também em 2011 no caso da Síria, sobre quem realmente são os manifestantes, o que realmente querem e de que lado do conflito cada vez mais violento estão ‘as simpatias’ do ocidente. Mas numa análise atenta mostra que, assim como a Irmandade Muçulmana foi usada na Síria para montar o cenário para a guerra devastadora que se seguiu, a Irmandade Muçulmana no Egipto também está a ser usada, praticamente do mesmo modo, contra o Cairo.

Finalmente, na Ucrânia, os manifestantes apresentados no ocidente como “pró-democracia”, “pró-União Europeia”, “Euromaidan” já foram revelados como neo-nazistas ultras da direita e nacionalistas, conhecidos por recorrer regularmente à violência e à intimidação política. Exactamente como se viu na Síria em 2011 e no Egipto agora, confrontos armados de baixa intensidade em direcção ao que pode acabar como uma guerra por procuração entre a NATO e a Rússia na Europa Oriental.

Mas para estas três nações, e os participantes de todos os lados, o estado actual da Líbia deve ser examinados. Essas "revoluções" têm apenas uma conclusão lógica e previsível - o saque, divisão e destruição de cada respectivo país, antes de serem embrulhados na crescente ordem supranacional de Wall Street e Londres a ser explorado indefinidamente tanto pelos EUA, Reino Unido e UE como já o são hoje. Para os que quiserem saber o que será do Egipto, Síria e Ucrânia bastará olhar para o caso de sucesso da NATO na Líbia. E para aqueles que apoiaram a "revolução" na Líbia, devem-se perguntar se estão satisfeitos com o seu resultado final. Será que eles desejam este resultado para o Egito, Síria e Ucrânia também? Será que eles imaginam que os planos da NATO para cada um destes países vai acabar de forma diferente? Por quê?


sexta-feira, 22 de agosto de 2014

SITUAÇÃO E ESTATÍSTICAS DO CONFLITO UCRANIANO

SITUAÇÃO E ESTATÍSTICAS DO CONFLITO UCRANIANO



Fonte: ria.ru

A ESTRATÉGIA RUSSA FACE AO IMPERIALISMO ANGLO-SAXÓNICO

A ESTRATÉGIA RUSSA FACE AO IMPERIALISMO ANGLO-SAXÓNICO




A Organização de cooperação de Xangai representará, a partir do seu provável alargamento em Setembro de 2014, 40% da população mundial


O ataque dos Anglo-Saxões contra a Rússia toma a forma de uma guerra financeira e económica. Entretanto, Moscovo prepara-se para as hostilidades armadas desenvolvendo a auto-suficiência da sua agricultura e multiplicando as suas alianças para o efeito. Para Thierry Meyssan, após a criação do califado do Levante, Washington deverá jogar uma nova cartada, em Setembro, em São Petersburgo. A capacidade da Rússia em preservar a sua estabilidade interna determinará, então, a sequência dos acontecimentos.


Por Thierry Meyssan - Rede Voltaire



A ofensiva conduzida pelos Anglos-Saxões (Estados-Unidos, Reino Unido e Israel) para dominar o mundo prossegue sobre dois eixos simultâneos: quer, por um lado, a criação do «Médio-Oriente alargado» (Greater Middle East), atacando simultaneamente o Iraque, a Síria, o Líbano e a Palestina, como, por outro, o afastamento da Rússia da União Europeia, através da crise que eles montaram na Ucrânia.

Nesta corrida de velocidade, parece que Washington quer impôr o dólar como moeda única no mercado do gaz, a fonte de energia do XXIo século, do mesmo modo que a impuseram sobre o mercado do petróleo [1].

Os média (mídia-Br) ocidentais quase que não cobrem a guerra do Donbass, e a sua população ignora a amplitude dos combates, a presença dos militares US, o número das vítimas civis, a vaga dos refugiados. Os média ocidentais focam pelo contrário, com detalhe, os acontecimentos no Magrebe e no Levante, mas apresentando-os seja como resultantes de uma pretensa «primavera árabe» (quer dizer, na prática, de uma tomada de poder pelos Irmãos muçulmanos), seja como o efeito destrutivo de uma civilização violenta em si mesma. Mais do que nunca, seria necessário vir em socorro de árabes incapazes de viver, pacificamente, na ausência de colonos ocidentais.

A Rússia é actualmente a principal potência capaz de conduzir a Resistência ao imperialismo anglo-saxónico. Ela dispõe de três ferramentas: os BRICS, uma aliança de rivais económicos que sabem não poder crescer senão uns com outros, a Organização de cooperação de Xangai, uma aliança estratégica com a China para estabilizar a Ásia central, e por fim a Organização do Tratado de segurança colectiva (OTSC-ndT), uma aliança militar dos antigos Estados soviéticos.

Na cimeira de Fortaleza (Brasil), que se desenrolou de 14 a 16 de julho, os BRICS deram o passo em frente anunciando a criação de um Fundo de reserva monetária (principalmente chinês) e de um Banco BRICS, como alternativas ao Fundo monetário internacional e ao Banco mundial, portanto ao sistema-dólar [2].

Antes mesmo deste anúncio, já os Anglo-Saxões haviam posto em acção a sua resposta: a transformação da rede terrorista Al-Qaida num califado, afim de preparar os conflitos entre todas as populações muçulmanas da Rússia e da China [3]. Eles prosseguiram a sua ofensiva na Síria e transbordaram-na quer para o Iraque, quer depois para o Líbano. Falharam, por outro lado, no expulsar de uma parte dos Palestinianos para o Egipto e a desestabilizar mais profundamente ainda a região. Por fim, eles mantiveram-se afastados do Irão(Irã-Br), para dar ao presidente Hassan Rohani a chance de enfraquecer a corrente anti-imperialista dos khomeinistas.

Dois dias após o anúncio dos BRICS, os Estados Unidos acusaram a Rússia de ter destruído o vôo MH17 da Malaysia Airlines por cima do Donbass, matando 298 pessoas. Sobre esta base, puramente arbitrária, impuseram aos Europeus a entrada em guerra económica contra a Rússia. Assumindo-se como um tribunal o Conselho da União europeia julgou e condenou a Rússia, sem a menor prova e sem lhe dar a oportunidade de se defender. Ele promulgou «sanções» contra o seu sistema financeiro.

Consciente que os dirigentes europeus não trabalham pelos interesses dos seus povos, mas sim pelos dos Anglo-Saxões, a Rússia mordeu o seu freio e interditou-se, até à data, de entrar em guerra na Ucrânia. Ela apoia com armas e com informação os insurgentes, e acolhe mais de 500. 000 refugiados, mas, abstêm-se de enviar tropas e de entrar na engrenagem. É provável que ela não intervenha antes que a grande maioria dos Ucranianos se revolte contra o presidente Petro Porochenko, mesmo que isso signifique não entrar no país senão após a queda da República popular de Donetsk.

Face à guerra económica, Moscovo escolheu responder por medidas similares, mas envolvendo a agricultura e não as finanças. Dois considerandos guiaram esta escolha: primeiro, a curto prazo, os outros BRICS podem mitigar as consequências das pretensas «sanções»; por outro lado, a médio e longo prazo, a Rússia prepara-se para a guerra e entende reconstituir completamente a sua agricultura, para poder viver em auto-suficiência.

Por outro lado, os Anglo-Saxões previram paralisar a Rússia pelo interior. Primeiro activando para tal, via Emirado islâmico (EI), grupos terroristas no seio da sua população muçulmana, depois organizando também uma contestação mediática aquando das eleições municipais de 14 de setembro. Consideráveis somas de dinheiro foram fornecidas a todos os candidatos da oposição, numa trintena de grandes cidades envolvidas, enquanto pelo menos 50. 000 agitadores ucranianos, misturados com os refugiados, estão em vias de se reagrupar em São Petersburgo. A maior parte de entre eles têm a dupla nacionalidade russa. Trata-se, com toda a evidência, de reproduzir na província as manifestações que em Moscovo (Moscou-Br) se seguiram ás eleições de dezembro de 2011 —a violência sobretudo—; e de mergulhar o país num processo de revolução colorida ao qual uma parte dos funcionários e da classe dirigente é favorável.

Para o realizar Washington nomeou um novo embaixador na Rússia, John Tefft, que já preparara a «revolução das rosas» na Geórgia e o golpe de Estado na Ucrânia.

Será importante para o presidente Vladimir Putin poder confiar no seu Primeiro- ministro, Dmitri Medvedev, que Washington esperava recrutar para o derrubar.

Considerando a iminência do perigo, Moscovo teria conseguido convencer Pequim a aceitar a adesão da Índia contra a do Irão (mais, também, as do Paquistão e da Mongólia) à Organização de cooperação de Xangai (OCS em inglês-ndT). A decisão deveria ser tornada pública aquando da cimeira prevista para Duchambe (Tajiquistão) entre 12 e 13 de setembro. Ela deveria pôr um fim ao conflito que opõe, desde há séculos, a Índia e a China, e envolvê-los numa cooperação militar. Esta reviravolta, se se confirmar, terminaria igualmente com a lua de mel entre Nova Deli e Washington, que esperava afastar a Índia da Rússia dando-lhe acesso, por tal, nomeadamente a tecnologias nucleares. A adesão de Nova Deli é também uma aposta acerca da sinceridade do seu novo Primeiro-ministro, Narendra Modi, quando pesa sobre ele a suspeita de ter encorajado violências anti-muçulmanas, em 2002, em Gujarate, do qual era ministro-chefe.

Por outro lado a adesão do Irão, que constitui um desafio para Washington, deverá trazer ao OCS um conhecimento preciso dos movimentos jihadistas e das maneiras de combatê-los. Mais uma vez, se confirmada, tal reduziria a disposição iraniana para negociar uma trégua com o «Grande Satã», que a levou a eleger o Xeque Hassan Rohani para a presidência. Isto seria uma aposta quanto à autoridade do líder supremo da Revolução Islâmica, o aiatola Ali Khamenei.

De facto, estas adesões marcariam o início da viragem do mundo do Ocidente para o Oriente [4]. Ainda assim, esta evolução deverá ser protegida militarmente. É o papel da Organização do Tratado de Segurança Coletiva(OTSC), formado em volta da Rússia, mas do qual a China não faz parte. Ao contrário da Otan, esta organização é uma aliança clássica, compatível com a Carta das Nações Unidas, uma vez que cada membro conserva a opção de sair dela, se o desejar. É, pois, apoiando-se nessa liberdade que Washington tem tentado, no decurso dos últimos meses, comprar alguns membros, nomeadamente a Arménia. No entanto, a situação caótica na Ucrânia parece ter arrefecido aqueles que nela sonhavam com uma «proteção» norte- americana.

A tensão deverá pois subir nas próximas semanas.


[1] « Qu’ont en commun les guerres en Ukraine, à Gaza, en Syrie et en Libye ? »(Fr-«Que teêm em comum as guerras na Ucrânia, Gaza, Síria e na Líbia?»- ndT) , por Alfredo Jalife-Rahme, Traduction Arnaud Bréart, La Jornada (México), Réseau Voltaire, 7 août 2014.

[2] “Cúpula do Brics: Sementes de uma nova arquitetura financiera”, Ariel Noyola Rodríguez, Rede Voltaire, 3 de Julho de 2014. “Sixth BRICS Summit : Fortaleza Declaration and Action Plan” (Ing-«Sexta Cimeira do BRICS: Declaraçãode Fortaleza e Plano de Acção»-ndT), Voltaire Network, 16 July 2014.

[3] «Un djihad mondial contre les BRICS ?» (Fr-«Uma jihade mundial contra os BRICS?»-ndT), por Alfredo Jalife-Rahme, Traduction Arnaud Bréart, La Jornada (México), Réseau Voltaire, 18 juillet 2014.

[4] “Russia and China in the Balance of the Middle East : Syria and other countries” (Ing-« Rússia e China no Balanço do Oriente Médio: Síria e outros países»-ndT), por Imad Fawzi Shueibi, Voltaire Network, 27 Janeiro de 2012.




Thierry Meyssan Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación (Monte Ávila Editores, 2008).


quinta-feira, 21 de agosto de 2014

ENCOBRIMENTO ? PORQUE OS MÉDIA E A ADMINISTRAÇÃO OBAMA FICARAM SILENCIOSOS ACERCA DO MH17 ?





Por Niles Williamson

Ucrânia - O silêncio ensurdecedor dos media e do governo dos EUA acerca da investigação do derrube do MH17 da Malaysian Airlines, há um mês, tresanda a encobrimento.

Nas horas e dias que se seguiram ao crash, sem uma única sombra de evidência, responsáveis dos EUA alegaram que o jacto de passageiros fora derrubado por um míssil terra-ar SA-22 disparado do território mantido por separatistas pró russo no Leste da Ucrânia. Eles lançaram uma campanha política a fim de obter duras sanções económicas contra a Rússia e fortalecer a posição militar da NATO na Europa do Leste.

Capa da 'Der Spiegel', 28/Julho/14. Apanhando a pista, os cães de ataque da CIA nos media estado-unidenses e europeus acusaram sem rodeios o presidente russo Vladimir Putin pelo crash. A capa da edição de 28 de Julho da revista alemã Der Spiegel mostrava as imagens das vítimas do MH17 circundando grossas letras vermelhas com o texto "Stoppt Putin Jetzt!" (Travem Putin agora!). Um editorial de 26 de Julho de The Economist declarava Putin como autor da destruição do MH17, enquanto a capa da revista morbidamente sobrepunha a cara de Putin a uma teia de aranha, denunciando a "teia de mentiras" de Putin.

Alguém que comparasse a demonização de Putin pelos media com o tratamento que deram a Saddam Hussein ou Muammar Gadafi tem de concluir que Washington estava a lançar uma campanha pela mudança de regime na Rússia tal como aquelas que executaram na Líbia e no Iraque – desta vez, loucamente, empurrando os Estados Unidos rumo à guerra com uma potência nuclear armada, a Rússia.

Contudo, depois de terem transformado o crash num casus belli contra a Rússia, os media dos EUA subitamente deixaram completamente de falar no assunto. O New York Times não considerou apropriado imprimir nem uma palavra sobre o crash do MH17 desde 7 de Agosto.

Não há qualquer explicação inocente para o súbito desaparecimento do MH17 dos media e da atenção política. A caixa negra do avião esteve durante semanas na Grã-Bretanha para exames e os satélites e radares militares estado-unidenses e russos estiveram a esquadrinhar intensamente o Leste da Ucrânia no momento do crash. A afirmação de que Washington não tem conhecimento pormenorizado das circunstâncias do crash e das várias forças envolvidas não é crível.

Se a evidência que está nas mãos de Washington incriminasse a Rússia e as forças apoiadas pela Rússia, ela teria sido divulgada para alimentar o furor dos media contra Putin. Se não foi divulgada, isto é porque a evidência aponta para o envolvimento do regime ucraniano de Kiev e dos seus apoiantes em Washington e nas capitais europeias.

Desde o princípio, a administração Obama nunca apresentou evidência para apoiar as acusações incendiárias de que Putin fora responsável pelo crash do MH17. No seu comunicado à imprensa de 18 de Julho, no dia seguinte ao crash, o presidente Obama declarou que ainda era "demasiado cedo para sermos capazes de imaginar que intenções tiveram aqueles que podem ter lançado este míssil superfície-ar".

Apesar de cinicamente explorar o crash para pressionar e ameaçar a Rússia, Obama advertia que "provavelmente haverá desinformação" na cobertura do crash. Num reconhecimento indirecto de que não tinha provas para apoiar suas afirmações, ele disse: "Em termos de identificação específica de que indivíduos ou grupo de indivíduos ou pessoal ordenaram o ataque, como aquilo aconteceu, são coisas que penso estarem ainda sujeitas a informação adicional que estamos a reunir".

Neste evento, a desinformação sobre o crash do MH18 veio da própria administração Obama. O secretário de Estado John Kerry prosseguiu em 20 de Julho num ataque nos media, argumentando que os separatistas pró russos e o governo russo eram responsáveis pelo derrube.

A única evidência que ele apresentou foram uns poucos dúbios "registos nos media sociais" postados na Internet. Ele apresentou registos áudio não autenticados de separatistas a falaram de um crash de avião, áudio editado e divulgado pela agência de inteligência SBU da Ucrânia, a qual trabalha estreitamente com a CIA; vídeo clips do YouTub a mostrar um camião a transportar equipamento militar não identificado ao longo de uma estrada; e uma desmentida declaração em media social a afirmar que a responsabilidade do derrube do avião atribuía-se ao líder separatista Igor Strelkov.

Muito rapidamente, a narrativa do governo dos EUA sobre o MH17 começou a entrar em colapso. Num comunicado de imprensa de 21 de Julho, a porta-voz do Departamento de Estado e antiga analista da CIA para o Médio Oriente, Marie Harf, declarou que as conclusões da administração Obama quanto ao derrube do avião foram "baseadas em informação aberta a qual é basicamente de senso comum". Desafiada por repórteres a proporcionar evidência, ela admitiu que não podia: "Sei que é frustrante. Acreditem-me, tentámos obter tanto quanto era possível. E por alguma razão, por vezes não podemos".

Depois de um mês, durante o qual Washington fracassou em apresentar evidência para apoiar suas acusações contra Putin, está claro que a ofensiva política dos governos NATO e a histeria dos media contra Putin eram baseadas em mentiras.

Se separatistas pró russos dispararam um míssil solo-ar, como afirma o governo dos EUA, a Força Aérea teria imagens na sua posse confirmando isso sem sombra de dúvida. O Defense Support Program da US Air Force utiliza satélites com sensores infra-vermelhos para detectar lançamentos de mísseis em qualquer lugar sobre o planeta e os postos de radar estado-unidenses na Europa teriam rastreado o míssil quando ele atravessava o céu. Estes dados de satélite e radar não foram divulgados, porque seja o que for que mostrem não se ajusta à narrativa cozinhada pelo governo dos EUA e os media.

O que aflorou, ao invés, foi uma série de evidências a apontarem para o papel do regime de Kiev apoiado pelos EUA no derrube do MH17. No dia seguinte ao de Kerry ter feito suas observações, os militares russos apresentaram dados de radar e de satélite indicando que um caça a jacto SU-25 ucraniano estava na vizinhança imediata e ascendia em direcção ao MH17 quando ele foi derrubado. A afirmação não foi corrigido e muito menos refutada pelo governo americano.

O denunciante da NSA William Binney e outros agentes aposentados da inteligência americana emitiram uma declaração no fim de Julho pondo em causa os dados dos media sociais apresentados por Kerry e pedindo a publicação de imagens de satélite do lançamento do míssil. Eles acrescentaram: "Estamos a ouvir indirectamente de alguns dos nossos antigos colegas que o que o secretário Kerry está a apregoar não se enquadra com a inteligência real".

Em 9 de Agosto, o New Straits Times, da Malásia, publicou um artigo acusando o regime de Kiev pelo derrube do MH17. Declarava que a evidência do sítio do crash indicava que o avião fora derrubado por um caça ucraniano com um míssil seguido por fogo pesado de metralhadora.

Se bem que seja demasiado cedo para dizer conclusivamente como o MH17 foi derrubado, a preponderâncias das evidências aponta directamente para o regime ucraniano e, para além dele, o governo americano e as potências europeias. Eles criaram as condições para a destruição do MH17, apoiando o golpe dirigido por fascistas em Kiev no mês de Fevereiro que levou ao poder o actual regime pró ocidental. Os media ocidentais portanto apoiaram a guerra do regime de Kiev no Leste da Ucrânia para eliminar a oposição ao putsh, transformando a região na zona de guerra em que foi abatido o MH17.

Após o assassínio das 298 pessoas a bordo do MH17, no qual desempenharam um papel importante ainda que por explicar, os governos e as agências de inteligência ocidentais aproveitaram a tragédia numa manobra precipitada e sinistra para escalar ameaças de guerra contra o regime Putin. O silêncio indica consentimento e o silêncio ensurdecedor dos media ocidentais sobre a questão do envolvimento de Kiev no crash do MH17 atesta a criminalização não só da política externa do establishment como também dos seus lacaios dos media e de toda a classe dominante.

O original encontra-se em www.globalresearch.ca
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domingo, 17 de agosto de 2014

O QUE AS GUERRAS NA UCRÂNIA, GAZA, SÍRIA E LÍBIA TÊM EM COMUM

O QUE AS GUERRAS NA UCRÂNIA, GAZA, SÍRIA E LÍBIA TÊM EM COMUM ?

O jogo de vídeo mais vendido em todo o mundo "Call of Duty: Modern Warfare" [‘Cumprimento do Dever: Operações Militares Modernas’ – NT] coloca os Estados Unidos contra a Rússia num cenário de guerra pelo petróleo.

 

Por Alfredo Jalife-Rahme

Para o especialista mexicano em geopolítica Alfredo Jalife-Rahme, a simultaneidade dos eventos ilumina o seu significado: logo depois de anunciar a criação de uma alternativa ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco Mundial, isto é, o dólar, a Rússia está a ter que enfrentar, ao mesmo tempo, a acusação de ter derrubado o jacto da Malaysia Airlines; o ataque israelita em Gaza, apoiado pela inteligência militar dos EUA e do Reino Unido; o caos na Líbia; e a ofensiva do Estado Islâmico no Levante. Além disso, em cada um desses teatros de guerra, a luta gira em torno do controle dos hidrocarbonetos, que até agora foram negociados exclusivamente em dólares.



Calendários, fluxogramas, diagramas e índices genealógicos são muito úteis para se fazer uma análise geopolítica. Assim, dois dias antes de um misterioso míssil explodir o avião da Malaysia Airlines no céu – um evento tão obscuro como as circunstâncias de ambos os seus voos recentes – a sexta cimeira dos BRICS, incluindo um número de países membros da Unasul, como a Colômbia e o Peru, tinha terminado com sucesso. [1]

Um dia antes do ataque do míssil fatal, Obama fez uma elevada pressão sobre a Rússia e os  seus dois activos inextricáveis: bancos e recursos energéticos. "Por pura coincidência", no dia em que o misterioso míssil foi disparado na Ucrânia, "Netanyahu, no leme de um estado com arsenal nuclear, ordenou que o seu exército invadisse a faixa de Gaza", como Fidel Castro correctamente apontou quando denunciou o golpe de estado em Kiev, que ele acusou de ter realizado uma "nova forma de provocação" sob o patrocínio dos Estados Unidos. [2]

O que esse velho desmancha-prazeres das Caraíbas poderia saber sobre esse caso?

Enquanto o míssil misterioso veio a destruir o voo da Malaysia Airlines, Israel, um estado racista e segregacionista, invadia a faixa de Gaza, em violação das resoluções da ONU e "antagonizando a opinião pública internacional", conforme indicado pelo ex-presidente Bill Clinton. [3]

Simultaneamente com a "coincidência" (dixit Castro [dixit: Latin, as stated by– NT]) relativa aos objectivos geopolíticos na Ucrânia e na faixa de Gaza, confrontos de natureza declarada envolvendo o controle dos recursos de energia, tomaram o centro do palco nos três países árabes classificados como "Estados Fracassados" pelos estrategas dos EUA: Líbia, Síria e Iraque, para não mencionar as guerras no Iémene e na Somália.

Na Líbia, um estado balkanisado [dividido em pequenos ‘principados’ que frequentemente estão imersos em hostilidades – NT] e dizimado como resultado da intervenção "humanitária", liderada pela Grã-Bretanha e pela França sob a supervisão hipócrita dos Estados Unidos, apenas dois dias antes do míssil misterioso na Ucrânia, as brigadas rebeldes de Zintan barraram todo o acesso ao Aeroporto Internacional de Trípoli (capital), enquanto confrontos entre clãs rivais aumentavam em Benghazi, de onde jihadistas na Síria e no Iraque foram fornecidos com armas e onde o embaixador dos EUA na Líbia foi assassinado sob circunstâncias bizarras.

Além da ligação entre o fluxo de armas na Líbia, Síria e Iraque, na região controlada pela Al-Qaeda/Al-Nusra e o novo Estado Islâmico (Daesh) [4], a questão crucial para as empresas de petróleo e gás dos E.U.A., britânicas e francesas é assegurar o controle da matéria prima (gás e água fresca) pertencente à Líbia, onde a Rússia e a China ingenuamente caíram numa armadilha [5].

Quanto à apropriação de petróleo iraquiano pelo duo imperialista EUA / RU, que também levou à balcanização e destruição do Iraque, mergulhando o país numa "guerra de 30 anos", seria fútil e letalmente chato ter de rever as provas bem conhecidas.

Durante a minha recente visita a Damasco, onde eu fui entrevistado por Thierry Meyssan, presidente da Rede Voltaire, ele me disse que o repentino volte-de-face do "oeste (seja lá o que se entenda por isso)" contra Bashar al-Assad é devida em grande parte – além dos campos de gás localizados ao longo da costa mediterrânica – à profusão de depósitos de óleo que se encontram no interior da Síria, depósitos que agora são controlados pelo "Novo Califado (Daesh) do Século XXI ".

A interdependência entre petróleo e gás está no centro das atenções em Gaza cinco anos após a operação "Chumbo Fundido", cuja estratégia está a ser adoptada pela operação "Borda Protetora" (sic), sem uma investigação para estabelecer conclusivamente quem foi responsável pelo terrível assassinato dos três jovens israelitas – que haviam sido profecticamente anunciado por Tamir Pardo, o "visionário" chefe do Mossad [6] – e serviu como pretexto para outra invasão israelita da faixa de Gaza que ceifou a vida de umas várias centenas de crianças.

De acordo com o que o geógrafo, Manlio Dinucci, escrevendo no jornal italiano Il Manifesto [7], a abundância de reservas de gás nas águas costeiras de Gaza é uma das razões para a intransigência israelita.

Da mesma forma, as substanciais reservas de gás de xisto, profundamente enterradas na República Autónoma de Donetsk, que visa separar-se ou tornar-sen uma federação da Ucrânia, é a fonte da feroz guerra psicológica entre os média pro-UE e pró Rússia para fixar a responsabilidade do outro lado da explosão do avião da Malaysia Airlines. Será que não poderia ter sido uma operação sob falsa bandeira inventada pelo governo da Ucrânia para incriminar os separatistas usando "gravações" que podem muito bem ter sido adulteradas para acusá-los de "terrorismo" e assim aniquilá-los?

Há dois meses, as notícias do canal Rússia Hoje (RT – Russia Today) – que é cada vez mais visto na América Latina para combater a desinformação expelida pelos média israelita-anglo-americana controlada e que foi submetida à censura pública pelo Secretário de Estado John Kerry – tinha já ressaltado a importância do gás de xisto na região de Donetsk (região no leste da Ucrânia que procura ganhar independência), e perguntava se "os interesses das companhias petrolíferas ocidentais não estariam por trás da violência" [8].

Com efeito, a parte oriental da Ucrânia, actualmente envolvida numa guerra civil, está cheia "de carvão e uma miríade de depósitos de gás de xisto na bacia do Dnieper-Donets." Em Fevereiro de 2013, a British Shell Oil assinou com o governo da Ucrânia (o anterior, que foi deposto por um golpe neo-nazista apoiado pela UE) um acordo de 50 anos para partilhar os lucros provenientes da exploração e extracção de gás de xisto na região de Donetsk. [9]

De acordo com o RT, "os lucros que Kiev não quer perder" são tantos que fizeram o governo ucraniano a desencadear uma "campanha militar [desproporcional] contra o seu próprio povo."

No ano passado, a Chevron assinou um acordo semelhante (com o mesmo governo) para 10 biliões de dólares.

Hunter Biden, filho do Vice-Presidente do EUA, foi nomeado para o Conselho de Directores da Burisma, a maior firma produtora de gás privada (supersic) na Ucrânia [10], a qual "abre uma nova perspectiva para a exploração de gás de xisto ucraniano" na medida em que "ela detém a licença abrangendo a bacia do Dnieper-Donets." John Kerry não será deixado para fora em relação à distribuição dos lucros, e Devon Archer, o seu antigo conselheiro e colega de faculdade do seu enteado, juntou-se à controversa empresa em Abril.

Pode uma ma licença de "desapropriação de imóveis" para explorar o gás de xisto na Ucrânia servir também como uma "licença para matar" inocentes?

Está o fracturamento hidráulico em processo de fracturar a Ucrânia? Esta tem sido uma característica permanente da trágica história da exploração de hidrocarbonetos por companhias de petróleo "ocidentais" ao longo do século XX.

Não há dúvida de que os hidrocarbonetos são o denominador comum das guerras na Ucrânia, no Iraque, na Síria e na Líbia.

______________________

[1] “6th BRICS Summit: the seeds of a new financial architecture”, by Ariel Noyola Rodríguez, Voltaire Network, 3 July 2014. “Sixth BRICS Summit: Fortaleza Declaration and Action Plan”, Voltaire Network, 16 July 2014. «Momento BRICS en Fortaleza», par Alfredo Jalife-Rahme, 17 juillet 2014.

[2] «Fidel Castro: El derribo de avión malasio es una "provocación insólita" de Ucrania», Russia Today, 17 July 2014.

[3] AFP, 17/07/14.

[4] «¿Yihad global contra los BRICS?», por Alfredo Jalife-Rahme, La Jornada (México), Red Voltaire , 18 de julio de 2014.

[5] «El botín del saqueo en Libia: "fondos soberanos de riqueza", divisas, hidrocarburos, oro y agua», by Alfredo Jalife-Rahme, La Jornada, 28 August 2011.

[6] „Mossad-Chef sagte Entführung der Jugendlichen voraus“, von Gerhard Wisnewski, Voltaire Netzwerk, 8. Juli 2014.

[7] “Gaza, il gas nel mirino”, di Manlio Dinucci, Il Manifesto (Italia), Rete Voltaire, 17 luglio 2014.

[8] «Shale gas and politics: Are Western energy giants’ interests behind Ukraine violence?», Russia Today, 17 May 2014.

[9] « L’Ukraine brade son secteur énergétique aux Occidentaux », par Ivan Lizan, Traduction Louis-Benoît Greffe, Однако (Russie), Réseau Voltaire, 2 mars 2013.

[10] “In Ukraine, Joe Biden’s son mixes business with pleasure”, Voltaire Network, 15 May 2014.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O PESADELO DA EUROPA A TORNAR-SE REALIDADE: AMÉRICA VS RÚSSIA ... NOVAMENTE

O PESADELO DA EUROPA A TORNAR-SE REALIDADE: AMÉRICA VS RÚSSIA ... NOVAMENTE



Por Dmitri Trenin


A Rússia está a aprender a viver em um novo ambiente hostil de sanções económicas lideradas pelos EUA e em confronto político com os Estados Unidos. Há mais de cinco meses após a alteração de regime em Kiev, que marcou o início de uma nova era na política externa de Moscovo e as suas relações internacionais, um esboço da nova estratégia de segurança da Rússia está a surgir. Ela é desenhada para o longo prazo e, vai provavelmente, ter impacto sobre o cenário global.

O pressuposto central nessa estratégia é que a Rússia está a responder às políticas norte-americanas que se destinam a enquadra-la e a imobiliza-la para baixo - e para trás. O Kremlin absolutamente não podia ignorar os acontecimentos na Ucrânia, um país de extrema importância para a Rússia. O levantamento armado em Kiev levou ao poder uma coligação de ultra-nacionalistas e políticos pró-ocidentais: a pior combinação possível que Moscovo poderia imaginar. O presidente Putin viu isso como um desafio tanto para à posição internacional da Rússia como à sua ordem interna.

Aceitando assim, o desafio, significa um verdadeiro conflito e de longo prazo com os Estados Unidos. A oposição verbal à hegemonia global dos EUA não foi suficiente. Ao contrário da guerra na Geórgia de 2008, a Ucrânia não foi um episódio que pudesse ser localizado e suportado com segurança. Essencialmente, a actual disputa russo-americana é sobre uma nova ordem internacional.

Para um futuro próximo, a Ucrânia continuará a ser o principal campo de batalha dessa disputa. As tácitas de Moscovo podem mudar, mas os seus interesses centrais não. O objectivo principal é barrar a entrada da Ucrânia na NATO, e a entrada dos militares dos EUA na Ucrânia. Outros objectivos incluem a manutenção da identidade cultural russa no sul e no leste da Ucrânia, e manter a Crimeia russa. No muito longo prazo, o estatuto da Crimeia será o emblema do resultado da competição.
Em termos mais amplos, a competição não é tanto pela Ucrânia enquanto europeísta e a sua direcção. Ao contrário ao início da Guerra Fria, com o seu medo generalizado e dominante do comunismo, a situação actual na Ucrânia e o conflito mais alargado entre os EUA e a Rússia pode ser fracturante. Os europeus ocidentais em geral ainda não vêem ainda nenhuma ameaça da Rússia; eles também dependem de fontes de energia russas e do mercado russo para as suas exportações de manufaturados.

A Rússia irá procurar salvar o máximo das suas relações económicas com os países da União Europeia quanto possível, especialmente para manter algum tipo de acesso à tecnologia e investimento europeu. Também irá trabalhar para proteger o mercado para o seu abastecimento de energia para a Europa. Nesse esforço, Moscovo vai se concentrar com a Alemanha, Itália, França, Espanha e vários outros países de menores dimensões - desde a Finlândia à Áustria e à Grécia - na qual a Rússia tem construído extensas relações comerciais.

O ideal que a Rússia gostaria de ver seria a Europa reconquistar uma medida de independência estratégica em relação aos Estados Unidos. Moscovo tem esperanças que a punição liderada pelos Estados Unidos à Rússia, feita principalmente às custa do comércio da UE com a Rússia, pode levar a divisões transatlânticas e divisões intra-UE. No entanto, os russos já sentem que no futuro próximo a Europa seguirá os Estados Unidos, mesmo que à distância. Assim, pelo menos no curto prazo, a Rússia terá que contar com uma Europa mais hostil.

Os cálculos russos de longo prazo estão relacionados com o surgimento constante de uma Alemanha como grande potência do século XXI e líder da Europa de facto. Este processo, ao longo do tempo, poderá dar á UE o carácter de um verdadeiro "player" estratégico e fazer das relações da Europa com os Estados Unidos mais equitativas. Mesmo que os interesses de Moscovo e Berlim difiram significativamente, uma Alemanha forte pode não necessariamente levar a uma fácil compreensão com a Rússia, as relações russo-alemãs são de uma prioridade crescente para o Kremlin.

Estes cálculos no entanto, são para um futuro distante. Por enquanto, a Rússia tenta compensar as perdas no comércio ocidental e a sua posição vis-a-vis com a Europa e os Estados Unidos através de uma nova extensão para a Ásia. A importância da China para a Rússia aumenta, pois é a única grande economia imune a sanções de iniciativa norte americanas. Preocupada ao mesmo tempo em tornar-se potencialmente demasiado dependente do seu gigantesco vizinho, a Rússia tentará envolver outros países, como o Japão e a Coreia do Sul, mas, como no caso da Europa, as relações desses países com a Rússia será limitado por causa das suas alianças com os Estados Unidos.

Dada a natureza fundamental do conflito entre a Rússia com os Estados Unidos, Moscovo procura agora consolidar as suas conexões com países não-ocidentais. O grupo BRICS, que reúne o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul, é uma plataforma natural para isso. A recente cimeira BRICS no Brasil deu um primeiro passo para a criação de instituições financeiras comuns. A Rússia recebeu algum apoio moral dos seus parceiros e está a trabalhar para melhorar as relações com os outros países na América Latina, Ásia, Médio Oriente e África. No entanto, para realmente fortalecer os seus laços com o não-Ocidente, a Rússia terá de expandir consideravelmente as relações económicas: uma exigência difícil. A Índia é aqui uma prioridade-chave, seguida pela ASEAN.

Politicamente, a Rússia já se posiciona a caminho - com todos aqueles descontentes com o domínio global dos EUA. Estes países estão a assistir ao confronto entre Rússia e os Estados Unidos, com grande interesse, e estão a tirar conclusões para si próprios. Em particular, eles olham para o que um país como a Rússia pode receber em troca com isso, e que custo tem de suportar por isso. Dada a natureza muito diversa do mundo não-ocidental, que a Rússia tem aderido agora, não é realista para Moscovo esperar muita da solidariedade dos seus parceiros de lá. No entanto, o dueto russo-chinês no Conselho de Segurança da ONU pode se tornar um ponto de encontro para aqueles que realmente precisam de uma alternativa à dominação ocidental.

O Kremlin entende, é claro, que as mais sérias ameaças potenciais à segurança nacional da Rússia vêm de dentro do país. No seu recente discurso proferido no Conselho de Segurança Nacional, o Presidente Putin alterou as prioridades do Kremlin, na seguinte ordem: melhoria das relações inter-étnicas no vasto e muito diversificado país; reforçar a ordem constitucional e a estabilidade política na Rússia; promoção do desenvolvimento económico e social, com especial atenção para as regiões expostas, vulneráveis, ou deprimidos da Federação Russa. Qualquer problema grave em qualquer uma dessas áreas, Putin está convencido, que poderá ser usada pelos Estados Unidos para enfraquecer a soberania da Rússia e a integridade territorial.

Esta lista pede mais controlo do governo sobre a situação interna, uma nova política económica para reindustrializar a Rússia e reduzir a sua dependência do Ocidente em áreas críticas, redistribuição cuidadosa de recursos para lidar com as fraquezas e vulnerabilidades e ganhar mais aliados para o governo em diferentes grupos da sociedade. Pede também uma educação mais consciente da elite nacional e patriótica das novas gerações de russos. Até certo ponto, a pressão ocidental auxilia os esforços do Kremlin.

Em termos de segurança militar, as principais ameaças para a Rússia, na visão de Putin, vêm de infra-estrutura militar da NATO que se avizinham para a Rússia (negociações quase feitas agora); das defesas de mísseis balísticos dos EUA, que são vistos como claramente dirigidas à desvalorização de dissuasão nuclear da Rússia; e dos sistemas estratégicos não nucleares que podem atacar alvos russos com alta precisão. Isto exige o reforço do próprio esforço de modernização militar da Rússia, com ênfase tanto sobre as forças nucleares que devem permanecer um elemento de dissuasão credível, e sobre as forças convencionais que podem ser utilizadas em vários cenários no perímetro das fronteiras da Rússia e no exterior. Os Estados Unidos e a NATO estão de volta como adversários prováveis.

A competição, pouco ética e assimétrica como pode ser, é provável que seja difícil e longa. As sanções não fará Putin recuar. Ele também sabe que se voltasse para trás, a pressão sobre ele iria aumentar. A elite russa pode ter que passar por uma grande transformação, e uma rotatividade do pessoal, como resultado do crescente isolamento do Ocidente, mas o povo russo em geral são mais propensos a aumentar o patriotismo sob pressão de fora - especialmente se Putin se inclinar a combater mais a corrupção pública e a arbitrariedade burocrática. Se o Kremlin, no entanto, transformar o país numa fortaleza sitiada e introduzir a repressão em massa, ele definitivamente vai perder.

É muito cedo para especular como o desafio pode acabar. As apostas são muito altas. Qualquer concessão séria por Putin irá levá-lo a perder o poder na Rússia, o que provavelmente irá tornar o país num grande sobressalto, e qualquer concessão séria pelos Estados Unidos - em termos de sitiar a Rússia - vai significar uma redução palpável de influência global dos EUA, com consequências para seguir na Ásia, no Oriente Médio e em outros lugares. Ironicamente, o desafio à actual potencia predominante do mundo não vem da presente segunda potencia mundial, mas a partir de um antigo candidato, que se pensava ser praticamente extinto. A China não poderia ter esperado por tal ajuda.


Dmitri Trenin é o Director do Carnegie Moscow Center. 


terça-feira, 12 de agosto de 2014

ANÁLISE CHOCANTE DO DERRUBE DO AVIÃO MH17 DA MALÁSIA. "A AERONAVE NÃO FOI ATINGIDA POR UM MÍSSIL"

ANÁLISE CHOCANTE DO DERRUBE DO AVIÃO MH17 DA MALÁSIA. "A AERONAVE NÃO FOI ATINGIDA POR UM MÍSSIL"


Por Peter Haisenko

A tragédia do MH 017 malaio continua a confundir. Os registos do voo estão na Inglaterra e são agora avaliados. O que pode vir daí? Talvez mais do que se suporia. Será especialmente interessante a gravação de voz depois de se examinar a foto do cockpit fragmentado. Como perito em aviação examinei atentamente as imagens dos destroços do avião malaio que estão a circular na Internet .

Primeiro, fiquei admirado de quão poucas fotos dos destroços podem ser encontradas com o Google. São todas de baixa resolução, excepto uma: A do fragmento do cockpit abaixo da janela do lado dos pilotos. Contudo, esta imagem é chocante. Em Washington podem-se agora ouvir pontos de vista que falam de um "erro / acidente potencialmente trágico" em relação ao MH 017. Dada esta imagem particular do cockpit isso não me surpreende de todo.

Entrada e saída de buracos de balas na área do cockpit


Recomendo clicar sobre a pequena foto à direita. Pode descarregá-la como ficheiro PDF, com boa resolução. Isto é necessário porque permitirá entender o que estou aqui a descrever. Os factos falam claro e alto e estão para além do âmbito da especulação: O cockpit mostra traços de disparos (shelling) ! Podem-se ver os buracos de entrada e saída. O bordo de uma parte dos buracos está inclinado para dentro. Estes são buracos mais pequenos, redondos e limpos, mostrando os pontos de entrada – a maior parte provavelmente de um projéctil com calibre de 30 milímetros. O bordo dos outros, os buracos de saída maiores e ligeiramente desgastados (frayed) mostram fragmentos de metal indicando projécteis produzidos pelo mesmo calibre. Além disso, é evidente que estes buracos de saída da camada exterior da estrutura reforçada de alumínio duplo estão retalhados ou inclinados – para fora! Além disso, podem ser vistos cortes menores, todos inclinados para fora, os quais indicam que estilhaços (shrapnel) saíram com força através da face externa (outer skin) a partir do interior do cockpit. Os rebites abertos também estão inclinados para fora.

Verificando as imagens disponíveis há uma coisa que se destaca: Todos os destroços das secções por trás do cockpit estão em grande medida intactos, excepto pelo facto de que restaram apenas fragmentos do avião. Só a parte do cockpit mostra estas marcas peculiares de destruição. Isto dá ao examinador uma pista importante. Este avião não foi atingido por um míssil na sua parte central. A destruição é limitada à área do cockpit. Agora é preciso considerar que esta parte é construída de material especialmente reforçado. Isto é assim porque o nariz de qualquer avião tem de resistir ao impacto de um grande pássaro a altas velocidades. Pode-se ver na foto que nesta área estavam instaladas ligas de alumínio significativamente mais fortes do que no restante da camada externa da fuselagem. Pode-se recordar o crash da Pan Am sobre Lockerbie. Houve um grande segmento do cockpit que, devido à sua arquitectura especial, sobreviveu ao crash numa peça inteira. No caso do voo MH 017 torna-se absolutamente claro que também houve uma explosão no interior do avião.

Destruição de tanque por um mix de munições

Então o que poderia ter acontecido? A Rússia publicou recentemente registos de radar que confirmam [a presença de] pelo menos um SU 25 ucraniano em estreita proximidade (close proximity) do MH 017. Isto corresponde à declaração do agora ausente controlador espanhol "Carlos" que viu dois aviões caças ucranianos na vizinhança imediata do MH 017. Se agora considerarmos o armamento de um típico SU-25 aprenderemos isto: Ele está equipado com uma arma de cano duplo de 30 mm, tipo GSh-302 / AO-17A, equipada com: um pente de 250 tiros de projécteis incendiários (incendiary shells) anti-tanque e projécteis de estilhaçamento explosivo (splinter-explosive) (dum-dum), dispostos em ordem alternada. Evidentemente dispararam sobre o cockpit do MH 017 de ambos os lados: os buracos de entrada e de saída são encontrados no mesmo de segmento de cockpit!

Agora considere o que acontece quando uma série de projécteis incendiários anti-tanque e projecteis de estilhaçamento explosivo atingem o cockpit. Afinal de contas eles são concebidos para destruir um tanque moderno. Os projécteis incendiários anti-tanque atravessaram parcialmente o cockpit e saíram do outro lado numa forma ligeiramente deformada. (Peritos forenses em aviação possivelmente poderiam encontrá-los no solo presumivelmente controlado pelos militares ucranianos do regime de Kiev – o tradutor). Afinal de contas, o seu impacto é calculado para penetrar a blindagem sólida de um tanque. Além disso, os projécteis de estilhaçamento explosivo, devido aos seus numerosos impactos, também deverão provocar explosões maciças no interior do cockpit, uma vez que são concebidos para assim fazer. Dada a rápida sequência de disparo do canhão GSh-302, isto provocará uma rápida sucessão de explosões dentro da área do cockpit num curto espaço de tempo. Recorde: cada um deles é suficiente para destruir um tanque.

Que "erro" foi realmente cometido – e por quem?

Porque o interior de um avião comercial é uma câmara pressurizada selada hermeticamente, as explosões, numa fracção de segundo, aumentarão a pressão no interior da cabine para níveis extremos ou ao ponto de ruptura. Um avião não está equipado para isto, ele explodirá como um balão. Isto explica um cenário coerente. Os fragmentos em grande medida intactos das secções traseiras romperam-se no meio do ar nos pontos mais fracos da construção, mais provavelmente sob extrema pressão interna do ar. As imagens do campo de resíduos espalhado amplamente e o segmento brutalmente danificado do cockpit ajustam-se como uma mão na luva. Além disso, um segmento da asa mostra traços de um tiro rasante, o qual em extensão directa leva ao cockpit. Curiosamente, descobri que tanto a foto de alta resolução do fragmento de bala que perfurou o cockpit como o segmento da asa com esfoladura nesse ínterim desapareceram das imagens Google. Não se pode virtualmente encontrar mais fotos dos destroços, excepto as bem conhecidas ruínas fumegantes.

Se ouvir as vozes de Washington que agora falam de um "erro / acidente potencialmente trágico", tudo o que resta é a pergunta de o que pode ter sido a natureza deste "erro" aqui perpetrado. Não me inclino a divagar muito no âmbito da especulação, mas gostaria de convidar outras pessoas a considerarem o seguinte: O MH 017 parecia semelhante no seu desenho tricolor àquele do avião do Presidente russo. O avião com o Presidente Putin a bordo estava ao mesmo tempo "próximo" do Malaysia MH 017. Em círculos da aviação "próximo" seria considerado algo entre 150 a 200 milhas [241 a 328 km}. Também, neste contexto, podemos considerar o depoimento da Sra. Tymoshenko, a qual queria abater o Presidente Putin com uma Kalashnikov.

Mas isto é pura especulação. Contudo, definitivamente, os disparos sobre o cockpit do Air Malaysia MH 017 não são especulação.



*Comandante da aviação com 30 anos de experiência. Trabalhou com o B727, DC8, B747, B737, DC10 e A340. Desde 2004 tem trabalhado como escritor e jornalista. Resumo biográfico .

O original em alemão encontra-se em www.anderweltonline.com/... e a versão em inglês em www.globalresearch.ca/...

Este artigo encontra-se também em http://resistir.info/



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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

WASHINGTON RELANÇA O SEU PROJECTO DE DIVISÃO DO IRAQUE

WASHINGTON RELANÇA O SEU PROJECTO DE DIVISÃO DO IRAQUE

O mapa do «Próximo-Oriente alargado» (Greater Middle East) segundo o estado-maior norte-americano, publicado em 2006 pelo coronel Ralph Peters.

Por Thierry Meyssan
Fonte : Al-Watan (Síria)

O brusco colapso do Estado iraquiano é apresentado pela imprensa internacional como sendo a consequência do ataque do grupo terrorista EIIL. Mas, quem poderá crer que um Estado poderoso, armado e organizado por Washington, poderia sucumbir em menos de uma semana diante de um grupo jihadista, oficialmente independente de qualquer Estado? Dito de outro modo, quem poderá crer que aqueles que apoiam o EIIL na Síria condenam, com sinceridade, a sua acção no Iraque? Thierry Meyssan revela o que as cartas escondem.


Desde 2001, o estado-maior dos Estados Unidos tenta fracturar o «Próximo-Oriente alargado» numa multiplicidade de pequenos Estados etnicamente homogéneos. O mapa da região remodelada foi publicado em julho de 2006 [1]. Ele prevê a divisão do Iraque em três, um Estado sunita, um xiita e um curdo.

O falhanço de Israel face ao Hezbolla, no verão de 2006 [2], e o da França e do Reino Unido face à Síria em 2011-14, deixava supôr que este plano tinha sido abandonado.

Não é o caso: o estado-maior dos EU tenta retomá-lo por intermédio destes condottieres modernos que são os Jihadistas.

Os eventos surgidos no Iraque, na semana passada, devem ser vistos sob este ângulo. A imprensa internacional insiste na ofensiva do Emirado islâmico no Iraque e no Levante (EIIL ou «Daesh» em árabe), mas esta é apenas uma parte da vasta acção em curso.

A ofensiva coordenada do EIIL e dos Curdos

Numa semana, o EIIL conquistou o que deveria tornar-se um emirado Sunita, enquanto os peshmergas (combatentes curdos-ndT) conquistaram o que deveria ser o Estado curdo independente.

O exército iraquiano, formado por Washington, deu Niníve aos primeiros e Kirkuk aos segundos. A sua própria estrutura de comando facilitou a desintegração: os oficiais superiores, tendo que recorrer ao gabinete do Primeiro-Ministro antes de mover as suas tropas, eram ao mesmo tempo privados de iniciativa de jogo e instalados como reizinhos nas suas zonas de acção. Por outro lado, era fácil ao Pentágono corromper certos oficiais para que eles incitassem os seus soldados à deserção.

Os parlamentares, convocados pelo Primeiro-ministro Nouri-Al-Maliki, também desertaram e não votaram o estado de emergência por falta de quorum, deixando o governo sem possibilidades de resposta.

Sem outra escolha para salvar a unidade do seu país, al-Maliki apelou a todos os aliados possíveis e imagináveis. Primeiro apelou ao seu próprio povo em geral, e à milícia xiita do seu rival Moqtada el-sadr em particular (o Exército de Mahdi), depois aos guardas da Revolução iranianos (o general Qassem Suleimani, comandante da força Jerusalém está, no momento, em Bagdad), finalmente aos Estados Unidos a quem ele pediu para voltarem e bombardear os assaltantes.

A imprensa ocidental sublinha, não sem razão, que o modo de governar do Primeiro- ministro frequentemente prejudicou, quer a minoria Sunita árabe, quer os laicos do Baas, tanto pareceu ser favorável sobretudo aos Shiitas. Porém, esta constatação é relativa: os Iraquianos reconduziram, aquando das eleições gerais de 30 de abril, a coligação (coalizão-Br) de Nouri al-Maliki. Esta obteve um quarto dos votos, ou seja três vezes mais que o movimento de Moqtada el-Sadr, tendo o resto dos votos ficado espalhado entre uma míriade de pequenos partidos.

A preparação da ofensiva contra a autoridade de Bagdad

A ofensiva do EIIL, por um lado, e dos Peshmergas por outro foi sendo preparada ao longo de muito tempo.

O Curdistão iraquiano começou a nascer, sob protecção dos Estados Unidos e do Reino Unido, com a zona de exclusão aérea decretada entre as duas invasões ocidentais (1991-2003). Depois com o derrube do presidente Saddam Hussein, ele adquiriu uma muito grande autonomia e entrou logo na esfera de influência israelita. Deste ponto de vista, é inconcebível que Telavive tenha estado ausente na tomada de Kirkuk. De facto, o actual governo regional de Erbil (capital curda-ndT) alargou a sua jurisdição, ao conjunto da zona iraquiana prevista pelo estado-maior Americano para formar o Curdistão independente.

O EIIL é uma milícia tribal Sunita, tendo integrado o grupo combatente da Al-Qaida no Iraque depois da partida de Paul Bremer III, e a entrega do poder político aos Iraquianos. A 16 de maio de 2010, um responsável da Al-Qaida no Iraque que tinha sido libertado em circunstâncias desconhecidas, Abou Bakr el-Baghdadi, foi nomeado emir e esforçou-se, posteriormente, por colocar a organização sob a autoridade da Al- Qaida.

No começo de 2012 combatentes do EIIL criam na Síria o Jabhat al-Nosra (quer dizer a Frente de apoio ao povo do Levante), como ramo sírio da Al-Qaida. Este grupo desenvolve-se com o relançamento do ataque franco-britânico contra a Síria, em julho 2012. É, finalmente, classificado como «organização terrorista» por Washington, no fim do ano, apesar dos protestos do Ministro francês das Relações exteriores (Negócos Estrangeiros-Lu), que saúda neles «o pessoal que faz o trabalho árduo no terreno» (sic) [3].

Os sucessos dos jihadistas na Síria, até à primeira metade do ano de 2013, modificaram a atratividade dos seus grupos. O projeto oficial da Al-Qaida de uma revolução islâmica global apareceu como utópico, enquanto a criação de um Estado islâmico num determinado território parecia ao alcance da mão. Daí a idéia de lhes atribuir a remodelagem do Iraque, que os exércitos dos EU não tinham conseguido realizar.

A operação plástica do EIIL foi realizada na Primavera de 2014, com a libertação de prisioneiros ocidentais, que ele detinha, Alemães, Britânicos, Dinamarqueses, Americanos, Franceses e Italianos. As suas primeiras declarações confirmavam, em todos os detalhes, as informações dos serviços secretos sírios: o EIIL é enquadrado por oficiais norte-americanos, franceses e sauditas. Entretanto, rápidamente os prisioneiros libertados faziam marcha-atrás e desdiziam as suas declarações sobre a identidade dos carcereiros. Foi neste contexto que o EIIL rompeu com a Al-Qaida, em maio de 2014, assumindo- se como rival, enquanto a Al-Nosra permaneceu como ramo oficial da Al-Qaida na Síria. Claro que, tudo isso nada mais é que uma fachada porque, na realidade, esses grupos são, desde a sua criação, apoiados pela CIA contra os interesses russos (Afeganistão, Bósnia-Herzegovina, Chechénia, Iraque, Síria).

Regressado em maio a organização regional, (e não mais a antena regional de uma organização global), o EIIL preparou-se para cumprir o papel que os seus comanditários lhe tinham atribuído há vários meses.

A organização é claro controlada, no terreno, por Abu Bakr al-Baghdadi, mas está sob a autoridade do príncipe Abdul Rahman al-Faisal, irmão do príncipe Saud al-Faisal (ministro das Relações Exteriores saudita desde há 39 anos) e do príncipe Turki al- Faisal (antigo diretor dos serviços Secretos e actual embaixador em Washington e Londres).

Em maio, os al-Faisal compraram uma fábrica de armamento na Ucrânia. Os depósitos(estoques-Br) de armas pesadas foram transportados por avião para um aeroporto militar turco, de onde o MIT (Serviço Secreto Turco ) os encaminhou por comboios (trens-Br) especiais para o EIIL. Parece pouco provável que esta cadeia logística possa ter sido implementada sem a Otan.

A ofensiva do EIIL

O pânico que tomou conta da população iraquiana é o reflexo dos crimes cometidos pelo EIIL na Síria: degolas, em público, dos «muçulmanos renegados» e crucificação de cristãos. Segundo William Lacy Swing (antigo embaixador dos EU na África do Sul, depois nas Nações Unidas, e actual diretor do Gabinete das Migrações internacionais), pelo menos 550 mil iraquianos teriam fugido diante dos jihadistas.

Estes números mostram a inépcia das estimativas ocidentais sobre o EIIL, segundo os quais ele não dispõe senão de 20 mil combatentes no total da Síria e do Iraque. A verdade é, provavelmente, três vezes superior, na ordem dos 60 mil combatentes; a diferença sendo feita exclusivamente por estrangeiros, recrutados no conjunto do mundo muçulmano e na maior parte das vezes não árabes. Esta organização tornou-se o maior exército privado do mundo, imitando no mundo moderno o papel dos condottieri da Renascença europeia.

Ela deverá desenvolver-se ainda mais considerando os seus espólios de guerra. Assim, em Mossul, ela capturou o Tesouro do distrito de Niníve, ou seja 429 milhões de dólares em dinheiro (o que chega para pagar os seus combatentes durante um ano completo). Além disso, apoderou-se de numerosos Humvees e de 2 helicópteros de combate que ela, imediatamente, integrou no seu dispositivo. Como os jihadistas não têm os meios para formar os pilotos, a imprensa internacional sugere que eles sejam antigos oficiais baasistas do regime do presidente Saddam Hussein. O que é altamente improvável, considerando que a guerra que opõe os baasistas laicos aos jihadistas define o cenário de fundo da guerra na Síria.

Reações internacionais

A ofensiva dos Peshmergas e do EIIL era esperada pelos partidários da Arábia Saudita na região. Assim, o presidente libanês Michel Suleiman (que tinha concluído uma alocução em Janeiro por um ressonante «Viva a Arábia Saudita!», em vez de um «Viva o Líbano!») tentou, por todos os meios, obter uma extensão do seu mandato (expirando a 25 de maio) por mais seis meses, de modo a estar aos comandos durante a crise actual.

Em todo caso as reações internacionais quanto à crise iraquiana são incoerentes: todos os Estados, sem excepção, condenam o EIIL no Iraque e denunciam o terrorismo, enquanto alguns deles — os Estados Unidos e os seus aliados— consideram, no mesmo momento, o EIIL como um aliado objectivo contra o Estado sírio, e alguns comanditam esta ofensiva – os Estados Unidos, a Arábia Saudita, a França, Israel e a Turquia.

Nos Estados Unidos o debate político público opõe os Republicanos, que pedem um reenvolvimento militar no Iraque, aos Democratas, que denunciam a instabilidade provocada pela intervenção de George W. Bush contra Saddam Hussein. Este pequeno jogo oratório permite mascarar que os eventos em curso servem os interesses estratégicos do estado-maior. e que ele está ali directamente implicado.

Seria, porém, possível que Washington tivesse armadilhado Ancara. O EIIL teria, nesta mesma altura, tentado tomar o controlo do túmulo de Süleyman Sah, na Síria no distrito de Raqqa. Esta sepultura é propriedade da Turquia, que dispõe de uma pequena guarnição naquele lugar, em virtude da cláusula de extraterritorialidade do Tratado de Ancara (imposto pelo colonizador francês em 1921). Mas esta ação pode, também, ter muito bem sido comanditada pela própria Turquia, que teria assim pretendido achar um pretexto para uma intervenção aberta na Síria [4].

Mais grave, aquando do cerco de Mossul o EIIL fez prisioneiros 15 diplomatas turcos e suas famílias, além de 20 membros das forças especiais turcas, no seu consulado, provocando a ira de Ancara. O EIIL também havia preso motoristas de camião (caminhão-Br)de pesados, que foram depois libertados. A Turquia que assegurou a logística do ataque do EIIL sente-se traída, sem que se saiba, de momento, se o foi por Washington, Riade, Paris ou Telavive. Este assunto faz relembrar a detenção, a 4 de julho de 2003, de 11 membros das forças especiais turcas pelo exército dos Estados Unidos em Souleimanieh (Iraque), popularizada pelo filme O vale de lobos no Iraque [5]. Este episódio provocara a crise mais importante dos últimos sessenta anos entre ambos países.

A hipótese mais provável é que Ancara não previa participar numa ofensiva tão ampla, e descobriu, no caminho, que Washington programava a criação do Curdistão. Ora, sempre de acordo com o mapa publicado em 2006, este deverá incluir uma parte da Turquia, tendo os Estados Unidos previsto dissecar não só os seus inimigos, mas também os seus aliados. A prisão dos diplomatas turcos e dos elementos das forças especiais turcas seria um meio de impedir Ancara de sabotar a operação.

Chegando na quinta-feira a Ancara vinda de Amã, a representante especial dos Estados Unidos no Conselho de Segurança, a embaixatriz Samantha Power, hipócritamente condenou as ações do EIIL. A presença no Próximo-Oriente da turifirária do intervencionismo moral de Washington, deixa supôr que uma reação dos Estados Unidos foi prevista para este cenário.

Pelo seu lado o Irão disse estar pronto, para ajudar a salvar o governo do xiita al- Maliki, enviando armas e conselheiros militares, mas não combatentes. O actual derrube do Estado iraquiano aproveita à Arábia Saudita, grande rival regional de Teerão, no exacto momento em que o Ministro dos Negócios Estrangeiros(Relações exteriores-Br), o príncipe Saoud Al-Faiçal (o irmão do chefe do EIIL), a convidou para negociações.

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[1] «Blood borders : How a better Middle East would look» (Ing-«Fronteiras de sangue: Como pareceria um melhor Médio-Oriente»-ndT), por Ralph Peters, Armed Forces Journal datado de Junho 2006.

[2] L’effroyable imposture : Tome 2, Manipulations et désinformations (Fr-Ler A Terrível Impostura: Volume 2, manipulações e desinformações-ndT), por Thierry Meyssan, éd. Alphée 2007.

[3] Citado em « Pression militaire et succès diplomatique pour les rebelles syriens» (Fr- «Pressão militar e sucesso diplomático para os rebeldes sírios»-ndT) por Tsabelle Mandraud (com Gilles Paris), Le Monde, 14 décembre 2012.

[4] « Suriye’ye karşı açık savaşa girmek için Türk komplosu» (Fr-«Complô turco para entrar em guerra aberta contra a Síria»-ndT), Voltaire Sitesine, 28 mars 2014.

[5] «L’anti-Hollywood turc à l’assaut des crimes états-uniens » (Fr- «O anti-hollywood turco ao assalto dos crimes americanos»-ndT), por Mireille Beaulieu, Réseau Voltaire, 5 mai 2006.



Thierry Meyssan Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación (Monte Ávila Editores, 2008).




segunda-feira, 4 de agosto de 2014

A GEOPOLÍTICA E AS DISPUTAS DE ENERGIA POR DETRÁS DA GUERRA DE ISRAEL-GAZA DE 2014





Por Karl Naylor

'Excepto algum elemento que mude fundamentalmente a equação - uma decisão israelita de voltar a ocupar Gaza, a erupção de uma terceira intifada na Cisjordânia - em algum momento tanto Israel como o Hamas estarão prontos para mediadores para ajudarem a construir algum cessar-fogo negociado'. -America needs to end its obsession with trying to fix everything in Gaza-Aaron David Miller.

Israel caminhará para uma vitória definitiva e irá esmagar o Hamas decisivamente como força política. A ausência de qualquer contexto geopolítico para a análise de Aaron Miller é perceptível. Israel tem como principal objetivo proteger os campos de gás marítimos de Gaza o melhor que poder para afastar uma potencial crise de energia e reforçar o Egipto, que também carece de gás barato.

Washington compartilha em parte o objectivo de manter o Egipto estável, mas foi cauteloso sobre a divisão preocupante que se abriu entre a Turquia e o Qatar, por um lado, e o Egipto, Israel e a Arábia Saudita, por outro. As crescentes tensões entre estes alinhamentos de potencias regionais estão a bloquear as negociações de paz efectivas.

O Hamas é apoiado pelo Qatar e pela Turquia, porque ambos têm um interesse geopolítico em estar em jogo com os seus aliados da Irmandade Muçulmana na Síria, pela qual eles esperam derrubar Assad e assim avançar na construção de um gasoduto Qatar Turquia em rivalidade com projectos energéticos regionais de Israel.

Israel, por sua vez, não quer que o eixo de influência sunita para o desenvolvimento e pelo Qatar seja capaz de transitar o gás até ao Mediterrâneo Oriental antes que eles desenvolvam plenamente os campos de gás de  Leviathan, Tamar e Mares de Gaza. Nem se quer querem o gasoduto rival entre o Irão, Iraque e Síria.

Uma razão pela qual Netanyahu ter ficado satisfeito em a diplomacia russa ter sido capaz de evitar a perspectiva de um ataque militar dos EUA e da França sobre a Síria (embora ele tenha elogiado a diplomacia enérgica dos EUA para trazer a Rússia ás negociações) foi que Israel não tem interesse em que Assad se vá tão cedo, mas sim na continuação do conflito.

Natanyahu fez questão de exortar os EUA a aceitarem o acordo da Rússia sobre armas químicas da Síria em 2013, apesar do seu gabinete o ter negado oficialmente, porque não estavam entusiasmados com a estratégia de Washington na Síria, que ficava a beneficiar muito mais o Qatar e a Turquia.

Por sua vez, o golpe de Estado no Egipto em 2013 foi apoiado por Israel, enquanto os EUA não foram tão entusiasmados inicialmente, com Kerry apenas a reafirmar o seu apoio total, algum tempo depois, quando os EUA tiveram de aceitá-lo como um facto consumado, em parte por causa da vergonhosa escala de assassinatos, mas também de modo a não irritar o Qatar e a Turquia.

Os EUA têm evitado de se envolverem demasiado no Médio Oriente desde que retiraram as suas tropas do Iraque. A revolução de xisto e a reorientação da atenção diplomática para a região da Ásia-Pacífico em 2011 foi parte disso. Desta forma, Israel tem mãos livres para esmagar o Hamas.

A razão é que, apesar da forte oposição pública à guerra de Israel em Gaza, poucas potências mundiais ou regionais têm qualquer interesse particular ou a capacidade de impedi-lo. Israel quer destruir o Hamas enquanto tem a oportunidade com o Egipto de Sisi de selar a fronteira e as frias relações entre o Irão, o Hezbollah e o Hamas.

Israel aproveitou a oportunidade para acabar com o Hamas para remover a sua capacidade com foguetes[rockets], na qual receava algo que poderia ser desencadeado contra a infra-estrutura de gás de Israel no Mediterrâneo Oriental. Em seguida, seria capaz de usar isso para colocar o AP numa posição em que poderia quebrar a sua aliança com o Hamas.

A mensagem seria, então, se a AP quer beneficiar das receitas do gás, ela e a Cisjordânia seria melhor não alinhar com o Hamas, pois não haveria mais vantagem. A estratégia de Netanyahu é cruel, mas parece que tanto as potencias dos Estados Unidos e da União Europeia terão pouco a perder se ele tiver sucesso.

A necessidade de cobrir as suas apostas em matéria da guerra de Israel em Gaza é em parte sobre a necessidade da UE para a diversificação energética. Israel poderia usar os suprimentos de GNL que estão definidas para serem exportadas no futuro, para a Ásia Oriental, assim como para promover a sua segurança regional, apoiando o Egipto e a Jordânia, que são vistos como ameaçados por jihadistas.

É difícil ver como a guerra de Israel em Gaza poderia ser feita de forma particularmente menos seguro. A única possibilidade disso acontecer seria se a ISIS ganhasse uma posição mais forte em Gaza à custa do Hamas. Ex-comandantes das IDF têm alertado para isso. Contudo, mesmo assim, isso não mudaria muito porque Netanyahu tem a intenção de prosseguir uma "guerra ao terror" generalizada.

O governo do Likud não faz distinção entre o Hamas, a Irmandade Muçulmana ou a ISIS: todos são fanáticos islâmicos jihadistas ao nível regional e global, impregnados com uma obsessão psicopatológica de destruir Israel e civilização ocidental.

Como um rico e em grande parte bastante eficaz 'Estado de segurança nacional', Israel não vai ser realisticamente ameaçado. O último atentado suicida foi em 2008. Essa ameaça tem sido largamente evitada. O Hamas não recebeu muita ajuda do Irão entre 2011-2014.

Parte disso está conectado com as divisões sectárias abertas e agravadas pelo conflito sírio. Continua a ser visto se o Hezbollah e o Irão irão colocar mais prioridade na sua luta contra os jihadistas sunitas do que começar a focar-se no que Israel possa vir a provar ser demasiado bem sucedido.

No entanto, é muito improvável e a realidade é que Netanyahu sabe que ele tem a melhor oportunidade que Israel tem tido nos últimos anos para obrigar a uma paz inteiramente nos seus termos, que ele se refere como um "cessar-fogo sustentável" ou uma "acalmia sustentável", e que mistura as agendas de segurança energética com a da "guerra contra o terrorismo".

Independentemente do custo humanitário, e que Israel acusa o Hamas por continuar a tentar lançar foguetes, até agora até Tel Aviv e Jerusalém, a guerra está definida para continuar até ele ganhar a segurança regional que quer, e é por isso que Netanyahu deixou bem claro que "esta será uma operação longa".






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