abril 2015
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segunda-feira, 27 de abril de 2015

O PLANEADO ATAQUE POR PARTE DOS EUA E DA FRANÇA À SÍRIA

O PLANEADO ATAQUE POR PARTE DOS EUA E DA FRANÇA À SÍRIA

Na manhã de sábado de 31 de Agosto de 2013, um oficial americano telefonou para o gabinete do presidente Francois Hollande dizendo-lhe que deveria esperar uma chamada do presidente Obama ao fim do dia. Assumindo que o telefonema dessa noite iria anunciar o início dos ataques aéreos dos EUA (contra a Síria), Hollande ordenou aos seus oficiais para finalizarem rapidamente os seus próprios planos de ataque.

Por Paulo Ramires


Após os grupos terroristas (oposição) terem fracassado no derrube do presidente sírio Bashar al-Assad, os EUA procuraram um plano de ataque à Síria, esse plano seria constituído por uma coligação de países aliados sobre o pretexto de que "o regime de Assad é responsável pelo uso de armas químicas contra o povo sírio", mas a verdade é que o governo de Assad supostamente não usou essas armas, mas elas foram usadas como concluiu uma missão das NU: "Provas claras e convincentes que os rockets de superfície-superfície contendo o agente nervoso sarin foram utilizados em Ein Tarma, Moadamiyah e Zamalka [bairros] na área de Ghouta área de Damasco".[1] Quem terá usado essas armas químicas teriam sido os rebeldes com a pretensão de fazer crer que a linha vermelha estabelecido por Washington - o uso de armas químicas a serem usadas por Assad - teria sido violada: "A resolução da ONU, que foi aprovada em 27 de Setembro pelo Conselho de Segurança tratada indirectamente com a noção de que as forças rebeldes, como an-Nusra também seriam obrigados a desarmar ....Nenhum grupo foi citado pelo nome. Enquanto o regime sírio continuava o processo de eliminação de seu arsenal químico, a ironia é que, depois do stock de agentes precursores de Assad é destruído, a al-Nusra e os seus aliados islâmicos podem acabar como a única facção dentro da Síria com o acesso aos ingredientes que podem criar sarin, uma arma estratégica que seria diferente de qualquer outro na zona de guerra. " [2]. Esta seria a arquitectura trabalhada para a justificação de uma invasão à Síria, mas a concretização de tal coligação estava condenada ao fracasso quando o parlamento britânico votou no dia 29 de Agosto contra o envolvimento do Reino Unido nos esforços dos Estados Unidos para atacar a Síria, muito provavelmente por causo do referendo sobre a independência da Escócia no muito próximo dia 18 de Setembro.[3] A Alemanha também tinha dito não a um envolvimento nessa coligação, ficando a coligação reduzida aos EUA e França com um apoio condicionado e marginal de Israel e Turquia, assim na manhã de sábado de 31 de Agosto de 2013, um oficial americano telefonou para o gabinete do presidente Francois Hollande dizendo-lhe que deveria esperar uma chamada do presidente Obama ao fim do dia. "Assumindo que o telefonema dessa noite iria anunciar o início dos ataques aéreos dos EUA (contra a Síria), Hollande ordenou aos seus oficiais para finalizarem rapidamente os seus próprios planos de ataque. Caças Rafale foram carregados com mísseis de cruzeiro Scalp, e foi dito aos seus pilotos para lançarem ao longo de um raio de 250 milhas munições sobre o Mediterrâneo. "[4] As forças envolvidas dos dois países - a força aérea francesa e as forças dos EUA - esperavam que a ordem final do presidente Obama para iniciar o seu ataque fosse dada. No entanto, mais tarde naquele mesmo dia, às 18:15, Obama telefonou ao presidente francês, para lhe dizer que o ataque marcada para as 03h00 da madrugada de 1 de Setembro, não teria lugar como o planeado. Ele disse-lhe que precisaria consultar o Congresso. [5] No entanto, três dias depois, ás 06:16 GMT terça-feira 3 de Setembro, dois mísseis foram lançados "a partir da parte central do Mar Mediterrâneo" dirigindo-se em direcção à costa da Síria, mas eles não chegaram à Síria. [6] "Os dois mísseis caíram no mar."[7] Existem várias versões diferentes do que aconteceu. De acordo com Israel Shamir: "Foi reivindicado por um jornal libanês citando fontes diplomáticas que os mísseis foram lançados de uma base aérea da NATO em Espanha e foram derrubados pelo sistema mar-ar de defesa baseado nos navio russos. Outra explicação proposta pela Asia Times diz que os russos empregaram os seus bloqueadores de GPS de baixo custo mas poderosos para tornarem os caros Tomahawks ineficazes, desorientando-os e levando-os a falhar. No entanto, outra versão atribuído o lançamento aos israelitas, se eles estavam a tentar dar preparação de partida ao shoot-out ou apenas se estavam apenas a observar as nuvens, como eles reclamam. "[8]

"A III Guerra Mundial quase ocorreu como os banksters desejam. Eles têm muitas dívidas, incluindo a dívida externa insustentável dos EUA. Se esses Tomahawks tivessem atingido os seus alvos, os banksters poderiam ter reivindicado Força Maior e rejeitado a dívida. Milhões de pessoas morreriam, mas biliões de dólares estariam seguros nos cofres do JP Morgan e do Goldman Sachs." [8]

Será difícil saber o que esteve na base do lançamento desses misseis e porque razão o seu lançamento descambou num falhanço total, mas uma coisa é certa evitou-se desencadear uma guerra total. "Todos nós podemos estar muito gratos por isso. No mapa abaixo, podemos ver a quantidade significativa de navios de guerra em várias posição ao largo da costa da Síria na altura." [9] Um artigo no Global Research refere-se a um "enorme envio de meios navais dos EUA e aliados que ocorre no Mediterrâneo oriental ao largo das costas da Síria mas também no Mar Vermelho e no Golfo Pérsico. "[10]



O ataque dos EUA e aliados à Síria parece ter sido cancelado e posteriormente adiado com o lançamento daqueles misseis cruzeiro e com o consequente abate dos mesmos, Israel Shamir diz que "as vontades de aço da América e da Euroásia tinham que se cruzar no Mediterrâneo Oriental". Mas se o ataque se concretizasse vários países e guerrilhas seriam envolvidos no conflito: "Menos notório foi o facto de a Rússia ter enviado uma força operacional naval preparada à ultima da hora, mas capaz de dar uma ampla visão ao redor da costa síria ao exército sírio. Não era uma força grande o suficiente para lutar contra a marinha dos EUA, mas era uma força operacional capaz de fornecer uma visão completa dos céus acima e para além da Síria para os militares sírios. Por outras palavras, pela primeira vez os EUA não puderam realizar um ataque surpresa à Síria, nem com mísseis de cruzeiro, nem com o poder aéreo. Pior, a Rússia, o Irão e o Hezbollah embarcaram num programa secreto e evidente de assistência material e técnica à Síria, que acabou por derrotar a insurgência Wahabita. "[11] 

À força naval dos EUA e Rússia juntou-se depois forças navais chinesas, mostrando a China um grande descontentamento com a iniciativa de Washington em atacar a Síria: "A China já teria enviado navios de guerra para a costa da Síria para "observar" as acções dos EUA e dos navios russos enquanto as tensões criadas perspectivavam a preparação para um ataque militar potencial sobre a Síria, que poderia vir já na próxima semana".  "De acordo com a agência de notícias russa Telegrafist.org, o Exército Popular de Libertação despachou o navio de desembarque anfíbio Jinggangshan, esse navio foi visto a passar pelo Mar Vermelho em direcção ao Canal do Suez, no Egipto, que leva até ao Mar Mediterrâneo e às águas ao largo da costa de Israel, Líbano e Síria. De acordo com o relato, o navio não foi enviado para quaisquer acções agressivas, mas está lá apenas para "observar" as acções de navios de guerra russos e norte-americanos. No entanto, o Jinggangshan está equipado para o combate e foi utilizado como parte de uma "demonstração de força" em manobras destinadas a defender o Mar do Sul da China no início deste ano."[12]

Entretanto no Conselho de Segurança das Nações Unidas, as movimentações faziam-se com destaque para a Rússia e China que colocou todo o seu peso político e militar para impedir qualquer acção bélica contra a Síria:  "Eles vetaram uma proposta anti-Síria no Conselho de Segurança das NU, e enviaram os seus navios de guerra para o Mediterrâneo. Foi por isso que Putin se manteve firme, não só pela Rússia, mas por toda a região da Euroásia." [8]

Navio de guerra russo Moskva
Será difícil apurar o que realmente aconteceu de Agosto para Setembro, mas sabe-se que a tensão entre os russos e os americanos que se tem mantido foi grande nessa altura, algo de diferente poderia ter acontecido se o planeado ataque pelos EUA e França tivesse sido levado a cabo. Ao que é referido, um modelo que foi usado no Iraque e na Líbia seria aplicado também na Síria. Este caso foi abafado pelos órgãos de comunicação social do ocidente e a discução sobre o assunto travada, não se chegando a saber ao certo porque os planos dos EUA tiveram de ser cancelados, mas a tensão na zona permanece até aos dias de hoje havendo actividades navais das duas partes por todo o mediterrâneo. O plano dos EUA e França que fora cancelado, teria sido substituído pelo reforça da posição estratégica do ISIS no terreno e na implementação do Estado Islâmico de forma a enfraquecer a Síria de Bashar al-Assad.


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[1] http://rt.com/news/churkin-un-chemical-report-938/

[2] http://www.globalresearch.ca/syria-un-mission-report-confirms-that-opposition-rebels-used-chemical-weapons-against-civilians-and-government-forces/5363139

[3] http://www.nydailynews.com/news/world/u-s-not-100-assad-behind-attacks-article-1.1440431

[4] https://medium.com/war-is-boring/69247c24253f

[5] http://israelmatzav.blogspot.com.au/2013/09/france-was-ready-to-strike-syria-obama.html

[6] http://beforeitsnews.com/middle-east/2013/09/two-missiles-launched-toward-syria-fall-into-the-sea-2454030.html

[7] http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/middleeast/syria/10282788/Missiles-launched-in-Mediterranean-towards-Syrian-coast-claims-Russian-defence-ministry.html

[8] http://www.globalresearch.ca/the-war-on-syria-the-september-2013-military-stand-off-between-five-us-destroyers-and-the-russian-flotilla-in-the-eastern-mediterranean/5355644

[9] https://fbcdn-sphotos-b-a.akamaihd.net/hphotos-ak-ash3/1176205_566256046755921_1140583716_n.jpg

[10] http://www.globalresearch.ca/massive-naval-deployment-us-and-allied-warships-deployed-to-syrian-coastline-before-the-august-21-chemical-weapons-attack/5347766

[11] http://thesaker.is/submarines-in-the-desert-as-my-deepest-gratitude-to-you/

[12] http://www.redflagnews.com/headlines/alert-china-sends-warships-to-syria-joining-russian-warships-in-mediterranean-sea


sexta-feira, 24 de abril de 2015

TTIP: A ILEGALIDADE GEOPOLÍTICA DOS EUA PARA AVASSALAR A UNIÃO EUROPEIA

TTIP: A ILEGALIDADE GEOPOLÍTICA DOS EUA PARA AVASSALAR A UNIÃO EUROPEIA

Um cenário que deveria alarmar os povos da União Europeia, que permanecem desinformados das negociações secretas realizadas pelos servis tecnocratas da Comissão Europeia; pela cumplicidade dos primeiros-ministros e presidentes dos 28 países da UE; e pela “censura inteligente” realizada por 98% dos diretores dos jornais, das revistas, das rádios e de todas as emissoras televisivas.


Por Achille Lollo, em Roma



No dia 9 de Outubro de 2014, o director geral de comércio da Comissão Europeia, o belga Karel De Gucht - que foi substituído pela sueca Cecília Mallstrom –, tornava público um documento de dezoito páginas, onde estavam resumidos, de forma bem sucinta, os termos do acordo de livre comércio, ainda em fase de negociação, entre a União Europeia e os Estados Unidos. O acordo foi codificado com a sigla TTIP, (Transatlantic Trade and Investment Partnership / Acordo Transatlântico para o Comércio e os Investimentos).

O texto integral das questões debatidas pelas comissões chefiadas por dois negociadores, o espanhol Ignácio Garcia Bercero para a União Europeia (UE) e Dan Mulley para os EUA, ainda permanece um misterioso segredo de Estado, de que somente oito membros da Comissão Europeia conhecem os conteúdos. Até os deputados do Parlamento Europeu, que no próximo mês de Junho deverão ratificar o texto do acordo, não sabem que tipo de acordo está sendo negociado.

Infelizmente, conhecem-se somente alguns capítulos relacionados ao comércio dos serviços públicos e o comércio pela internet (e-commerce), que foram publicados no ano passado pelo semanário alemão “Zeit”. Por sua parte, o jornal Huffington Post conseguiu veicular mais três capítulos sobre a energia, enquanto o organismo norte-americano Center for International Environmental Law (Centro Internacional de Direito Ambiental) conseguiu recuperar alguns textos sobre a normalização tarifária do sector químico.

Oficialmente, o TTIP estrelou em Junho de 2013, quando o presidente Barack Obama e o então presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, principiaram a primeira reunião das negociações, acabando uma complexa fase preparatória que se estendeu durante doze anos. Durante este tempo, aconteceu a falência do MAI (Acordo Multilateral para os Investimentos), o congelamento dos acordos promovidos no âmbito da Organização Mundial para o Comércio (OMC/WTO), o tratado de livre comércio do NAFTA, entre EUA, Canada e México, e o fim das negociações para a ALCA (acordo entre os EUA e os países da América Latina).

A experiência acumulada na definição desses acordos foi usada pelos EUA e a União Europeia para definir o TTIP e também o CETA (Acordo bilateral entre UE e Canadá), o TISA (Acordo Geral sobre os Serviços Públicos), o Tratado de Livre Comércio entre a UE e os países do Magrebe, e, por último, o TPIP, o Acordo de Livre Comércio Transpacífico entre os EUA e os países asiáticos, menos a China, a Coreia do Norte, o Vietname e a Índia.

Todos esses acordos respondem a lógica geopolítica da globalização do capitalismo, revelando-se, portanto, um poderoso instrumento ao serviço da estratégia global dos Estados Unidos e, ao mesmo tempo, necessário para permitir que as transnacionais e os conglomerados financeiros ergam um sistema de controle económico no mundo inteiro.

Hoje, os Estados Unidos pretendem reafirmar sua “leadership” no âmbito do novo contexto internacional, porque os efeitos e as consequências da dinâmica dos diferentes processos de globalização (económico, comercial, tecnológico, mediático e cultural) produziram importantes modificações no mundo. A principal dessas é a afirmação de uma alternativa geopolítica, sustentada pelos países emergentes, que hoje é liderada pelos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). De fato, a directa consequência da liberalização dos mercados provocou, também, a rápida decadência da “Trilateral” (EUA, Japão e União Europeia), que a partir de 1997, mesmo após a definição do Acordo Multilateral para os Investimentos (MAI,) não conseguiu mais afirmar sua centralidade, não obstante os EUA tivessem conseguido desintegrar a URSS e entrincheirar-se militarmente nas regiões petrolíferas do Oriente Médio.

Para readquirir uma centralidade geopolítica e geoestratégica, as “excelências” da Casa Branca foram consultar as velhas teorias da década de 50, elaboradas durante a execução do Plano Marshall na Europa. Por outro lado, deram muita atenção aos estudos realizados pelos analistas do CATO Institute e do Conselho Atlântico, que haviam analisado as consequências geopolíticas da globalização, cada vez mais profunda e dinâmica, e a afirmação do processo de liberalização dos mercados. Além disso, essas instituições mapearam as situações que a Casa Branca deveria controlar para reafirmar a liderança económica mundial dos Estados Unidos.

Na prática, os analistas do Cato Institute e dos Conselhos Atlânticos sugeriam às “excelências” da Casa Branca usarem a autoridade política e o poder militar para começar a redefinir os parâmetros standard da produção mundial, fixando normas aptas a por ordem nos mercados, além de impor a superação do conceito de trabalho assalariado.

Um cenário que os EUA assimilaram perfeitamente, tentando fixar as novas regras para a circulação das mercadorias e dos capitais e, em seguida, codificar os processos normativos dos diferentes sectores comerciais, com o objectivo de garantir às transnacionais e aos conglomerados de Wall Street um maior lucro e uma elevada capacidade de penetração em todos os sectores da economia mundial.

Elementos que seriam afirmativos em termos geopolíticos e geoestratégicos a partir de 1998, quando os EUA, após a frustrante experiência do MAI em 1997, em função do poder da indústria militar, da media e dos conglomerados financeiros de Wall Street, começaram a usar a arma dos tratados bilaterais para o comércio e os investimentos, com o objectivo de redefinir sua esfera de influência geoestratégica e expandir o potencial económico, tecnológico e cultural das transnacionais nos mercados do mundo inteiro.



Do NAFTA ao TTIP


O tratado de livre comércio entre EUA, Canadá e México, o “NAFTA” (North American Trade Agreement), ratificado em 1994 pelo presidente Bill Clinton, foi a primeira experiência em que as “excelências” da Casa Branca procuraram “harmonizar as normas do comércio bilateral com o México e o Canadá e, consequentemente, dar uma maior dinâmica à economia dos três países...”. Na realidade, foi uma brilhante realização que prejudicou o México. Visto que as transnacionais norte-americanas e canadianas conseguiram desenvolver formas de monopólio naquela parte do continente americano, que se revelaram os primeiros instrumentos metodológicos para contestar a soberania do Estado, o conceito de nação, a essência dos direitos dos cidadãos e, sobretudo, a função do trabalho e dos sindicatos.

Em seguida, George W. Bush tentou vassalar a América Latina e a América Central com o tratado para a Zona de Livre Comércio das Américas “FTAA””(Free Trade Area of the America, ALCA em espanhol), que, em 2005, perdeu suas expectativas em função do posicionamento crítico dos países do Mercosul e a intransigência do Brasil. Um tratado que, depois, foi definitivamente enterrado em 2008, quando nos EUA arrebentou a insolvência dos títulos mobiliários (Bonds), o que provocou uma crise financeira que desvendou as contradições do capitalismo norte-americanos, além de provocar autênticos desastres na Europa, na Ásia e no resto do mundo.

Entretanto, em 2009, após a pesada intervenção do FED, a economia dos EUA voltou a mostrar suas potencialidades. Em função disso, foram enfatizadas as relações políticas e económicas com os países da União Europeia que, em 2010, exportaram aos EUA produtos por um valor de 220 biliões de dólares. A manutenção desse nível e a conclusão dos trabalhos da Comissão Prodi – que havia dado preferência aos tratados multilaterais da União Europeia com outros países do mundo – reforçaram a ideia da necessidade de um tratado bilateral entre a Europa e os EUA.

Portanto, em 2010, os EUA formularam a proposta de um tratado de livre comércio que a Comissão Europeia aceitou de olhos fechados, apesar de ter pleno conhecimento de que as negociações não ficariam limitadas à definição de produtos ou à redução dos impostos aduaneiros, que já eram bastante baixos, visto que em média não ultrapassavam os 3%, excluindo alguns produtos têxteis e os componentes dos carros, que alcançavam 8%.

Hoje, sabemos que o tratado TTIP pretende “harmonizar as normativas” aviltando as barreiras “não tarifárias” que impedem às multinacionais e às grandes empresas exportadoras dos EUA poderem invadir os mercados europeus. Na realidade, o TTIP é uma espécie de “pé-de-cabra” com o qual a Chevron e as outras transnacionais da energia, a Monsanto e a Cargill, juntamente aos colossos do agro-business, da farmacêutica, da química, dos transportes, da electricidade e os conglomerados financeiros dos Estados Unidos tentarão desactivar os elementos normativos que até hoje travam as exportações norte-americanas aos países da União Europeia, por não apresentarem as mesmas garantias dos produtos europeus.

É necessário lembrar que a atitude de Karel De Gucht, o director geral de comércio da Comissão Europeia, foi determinante para direccionar as negociações sobre o TTIP. De fato, De Gucht provocou uma frenética paixão pelo TTIP quando declarou à imprensa que “segundo um estudo requerido pelas indústrias norte-americanas, com o TTIP, o PIB da União Europeia teria um crescimento de 1% em cada ano, além de registrar a criação de centenas de milhares de novos empregos”. Declarações estupefacientes, que permitiram ao presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, sigilar as negociações para não sofrer impedimentos com as críticas, do momento que o estudo económico pedido pela Comissão Europeia sublinhava que “o impacto do TTIP no PIB dos países da União Europeia ficaria limitado a um crescimento de 0,1% durante os primeiros dez anos”. Um valor que os economistas julgaram “insignificante”.

Porém, as críticas mais importantes que são feitas ao TTIP são, antes de tudo, de carácter político além das económicas, visto que, com a chamada “harmonização das normas”, as transnacionais norte-americanas, finalmente, poderão eludir o “princípio de precaução” que a União Europeia adoptou em 1992, logo após o encontro da ONU no Rio de Janeiro. Um princípio que se fundamenta “na lógica da precedência absoluta dos direitos das pessoas físicas acima dos direitos das pessoas jurídicas”. Por isso, nos países da União Europeia, um produto pode ser vendido somente após serem realizados os testes obrigatórios, por cujas bases as agências de controle certificam que o mesmo não prejudica os consumidores. Um princípio que não existe nos EUA, onde as agências de controle, seguindo a lógica do liberalismo económico, permitem a imediata comercialização dos produtos, que será interrompida somente quando milhares de consumidores denunciarem ter sido prejudicados com intoxicação ou outros problemas na saúde. Além disso, caberá ao consumidor dos EUA assumir os custos judiciários para julgar a indústria e obter uma indemnização.

À causa disso, as transnacionais farmacológicas norte-americanas, em maio de 2013, obrigaram o então negociador dos EUA, Michael Fromam, a inscrever na agenda das negociações realizadas em Bruxelas duas importantes contestações: A) a anulação do princípio de precaução, porque o mesmo provocaria aumentos no custo de produção, além de atrasar o lançamento de novos produtos no mercado; B) a legitimação dos brevês e dos direitos de propriedade intelectual para evitar a produção dos medicamentos genéricos. Segundo a “Big Farma” essas duas questões seriam “uma barreira não tarifária que impede de exercer o próprio direito de lucro”.

Em Agosto de 2014, o projecto da Casa Branca foi questionado por Joseph Stiglitz, prémio Nobel de Economia em 2011, que, na conferência do National Gallery of Scotland, realizada em Edimburgo, sentenciou: “Em suma, o TTIP provocará a redução das garantias sociais e a limitação dos direitos dos consumidores. Os defensores do TTIP afirmam que o acordo vai favorecer o crescimento económico nos países da União Europeia. Porém, a Tufts University do Massachusetts acabou um estudo que questiona a hipótese do crescimento, lembrando que o TTIP, na realidade, apresenta muitos efeitos negativos, entre os quais a desarticulação do mercado interno europeu, a depressão da demanda interna e, portanto, a consequente diminuição do PIB na maior parte dos países da União Europeia... Este estudo da Tufts University é importante porque enfoca o futuro da agricultura europeia, que, por ser formada em sua maioria por pequenas propriedades, não poderá resistir à desleal concorrência dos produtos geneticamente modificados (OGM); além disso, não podemos esquecer as diferenças qualitativas na criação dos bois, que nos EUA são engordados com os hormônios e fitormônios, enquanto a carne dos frangos é tratada com banhos de cloro!”.

A seguir, Joseph Stiglitz foi taxativo em denunciar que “o grande objectivo do TTIP é a desclassificação da função social do trabalho. Com esse acordo, a maior parte dos salários europeus será reduzida para os igualar aos dos EUA que, como todos sabem, são mais baixos que os europeus. Portanto, as filiais europeias das multinacionais norte-americanas serão as únicas a ter vantagens, visto que, finalmente, poderão pagar seus operários europeus segundo os parâmetros salariais que vigem nos EUA. O mais grave é que as contestações não poderão ser feitas nos tribunais trabalhistas nacionais. Nada disso! Com o TTIP, as acções trabalhistas deverão ser apresentadas junto de um Conselho de Arbitragem dos Estados Unidos, que não é um tribunal público, mas particular, controlado pelos advogados das multinacionais, que exercem também a função de juízes!”.

As vítimas do TTIP: agricultura, água, serviços públicos, meio ambiente, trabalho

Em 1996, as “excelências” do liberalismo norte-americano e britânico, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC/WTO), tentaram fazer aprovar um Acordo Geral sobre o Comércio dos Serviços (AGCS) para anular a lógica do “Welfare State”. Uma operação que desabou porque, no seio da OMC, prevaleceu a ideia de que “os serviços públicos não fornecem produtos comerciais. Pelo contrário, eles correspondem a direitos universais dos cidadãos, com o funcionamento de organismos e empresas públicas para a saúde, o ensino, as telecomunicações, a cultura entre elas...”. Um conceito que, segundo os “gurus” do liberalismo, teria reforçado de maneira absurda os sindicatos, criando nos países europeus um clima contrário ao lucro e inimigo das empresas particulares.

Entretanto, o alongamento da crise financeira e económica nos países da União Europeia e a imposição de drásticas medidas de austeridade fez com que as “excelências” da Casa Branca pudessem propor à Comissão Europeia um tratado de novo tipo capaz de sanear a economia europeia e acabar com o “fiscal compact” e as medidas de austeridade.

Agora, os principais jornais norte-americanos e britânicos admitem que, com a implementação do TTIP (acordo entre EUA e União Europeia), do TPIP (acordo entre EUA e países asiáticos) e do TISA (acordo para a globalização dos serviços públicos não privatizados), a economia capitalista entrará na sua fase superior. Por isso, na reunião do novo G7 (sem a Rússia e a China), Barack Obama pediu que o Parlamento Europeu ratifique logo o TTIP, do momento em que, com este acordo, o Estados Unidos serão a base de um colosso económico, tecnológico e financeiro capaz de rechaçar o avanço dos BRICS e, em particular, da China, que em 2014 desbancou os Estados Unidos com um ativo comercial de 4 triliões e 160 biliões de dólares, dos quais 2 triliões com as exportações.

À causa desse novo cenário, a Casa Branca quer que o TTIP seja aprovado logo pelo Parlamento Europeu, adoptando unicamente a versão norte-americana e, por isso, cerca de 600 conselheiros foram contratados pela Casa Branca. Se nas negociações irá prevalecer a versão dos EUA, certamente haverá profundas mudanças na economia europeia, em particular em Portugal, Espanha, França, Itália, Grécia, Bulgária e Roménia. Haverá, também, modificações nas relações entre cidadãos e instituições e no conceito de soberania nacional dos Estados europeus.

Um cenário que deveria alarmar os povos da União Europeia, que permanecem desinformados das negociações secretas realizadas pelos servis tecnocratas da Comissão Europeia; pela cumplicidade dos primeiros-ministros e presidentes dos 28 países da UE; e pela “censura inteligente” realizada por 98% dos directores dos jornais, das revistas, das rádios e de todas as emissoras televisivas. Por isso, em todos os países da União Europeia começou a campanha “STOP TTIP”, com o objectivo de informar devidamente as populações e, consequentemente, denunciar o que vai acontecer na Europa com o TTIP.

1) Agricultura, Criação e Soberania alimentar

Estes sectores serão esmagados com a chegada dos produtos OGM, que nos Estados Unidos têm preços de venda baixíssimos, em particular os produtos destinados à indústria alimentar, que inundarão os supermercados europeus. Por exemplo, com a redução das informações nas etiquetas dos produtos, os consumidores não saberão mais distinguir os produtos naturais dos OGM.

Ninguém poderá saber se a carne bovina ou suína vendida nos supermercados provém de animais que foram engordados com hormônios ou fitormônios. Se os frangos foram alimentados com rações à base de antibióticos e se a conservação foi feita com o cloro. A experiência mexicana com o NAFTA lembra que as transnacionais do agro-business norte-americana possuem uma perfeita estrutura financeira e de marketing publicitário, especializada em fazer campanhas para vender sementes OGM, os fertilizantes e os novos pesticidas. Produtos que durante os primeiros três anos de uso são vendidos quase a preços de custo.

Os pequenos e médios proprietários mexicanos que não aceitaram sujeitar-se ao poder do agro-business ficaram mortalmente prejudicados, em função da concorrência desleal dos produtos OGM. Por isso, a maioria foi obrigada a vender suas terras. Ao mesmo tempo, outros camponeses acreditaram nas campanhas de publicidade das empresas de biocombustíveis que exigiam o cultivo dos super-produtos OGM para a produção de biocombustíveis. Desta forma, a soberania alimentar, isto é, o direito a alimentos de qualidade e o direito à defesa do ambiente ficaram literalmente defraudados.

2) Água

Todos os governos que na Itália se sucederam depois do referendo de 2011, sobre o uso da água, se esqueceram que a soberania popular decidiu que a distribuição pública da água não poderia ser privatizada. Assim, para desviar esse obstáculo institucional, o governo Berlusconi inventou a “simplificação administrativa das empresas hídricas municipais”. Depois, o governo de Matteo Renzi emanou um decreto-lei que obrigou as empresas hídricas públicas a associar-se para criar empresas SA, cotadas nas Bolsas de Valores. Desta forma, o governo “democrático “de Matteo Renzi realizou uma “privatização branca”, visto que agora o objectivo principal dessas empresas não é mais o serviço universal da distribuição pública da água. Pelo contrário, todas as prioridades e as atenções são agora para o lucro e a valorização dessas empresas, que são como qualquer empresa privada. O exemplo da ACEA-ATO2 (a companhia energética da cidade) em Roma e na região de Lazio confirmou as previsões.

Por outro lado, se uma prefeitura ou um governo regional se recusa a entregar a empresa hídrica municipal ou quer contestar o aumento dos preços ou a falta de investimentos por parte dos novos gestores privados da empresa hídrica, filial de uma transnacional norte-americana, o investidor vai recorrer a um Conselho de Arbitragem dos Estados Unidos, chamado ISDS (Investor State Dispute Settlement), que poderá condenar a prefeitura ou o governo regional, ou até o governo nacional, com uma milionária indemnização, porque “o investidor perdeu o lucro previsto”.

3) Serviços Públicos

Sem querer especular sobre o conteúdo do novo tratado do TISA, que deverá regulamentar a comercialização dos produtos dos serviços públicos não privatizáveis, o TTIP prevê o cancelamento do conceito de serviço público universal. Por esse motivo, cada serviço prestado por uma instituição ou uma empresa pública (escola, hospital, transportes, electricidade, gás etc.) deverá ser considerado “um produto comercializado por um distribuidor privado e um cliente”. Desaparece, assim, o direito universal para a instrução, a saúde e todos aqueles serviços públicos que eram garantidos pelo “Welfare State” (o Estado do Bem estar Social).

Com o TTIP, haverá uma radical mudança no sistema dos “tickets” da saúde e vai desaparecer, também, o médico de família. De fato, os “tickets” serão ampliados por qualquer tipo de prestação médica e hospitalar. Quem não possui um seguro-saúde será direccionado aos hospitais ou postos de saúde para os “sem-seguro-saúde”, com evidentes diferenciações na qualidade dos serviços. É claro que também as universidades e todo tipo de curso superior serão transformados em “empresas”, com um balancete de custos que nunca poderá ser alterado.

Mas o pior vai acontecer com as grandes e médias empresas públicas do sector de electricidade (geração e distribuição), transporte rodoviário e ferroviário, onde caberá ao Estado gerir aqueles sectores que não geram lucro, a exemplo dos comboios suburbanos ou das linhas de camionetas para o interior. Todas estas empresas serão presas de assalto das grandes empresas norte-americanas e europeias que exigem, também, a liberalização dos contratos e das prestações de serviços. Em suma, com o TTIP as filiais das multinacionais não terão a obrigação de contratar a mão-de-obra local ou de comprar os materiais no território; aliás, poderão até “importar os trabalhadores!”.

4) Meio Ambiente

O conflito geoestratégico entre os EUA e a Rússia levou o presidente Obama a pedir aos chefes de governos dos principais países europeus a substituição do fornecimento do gás russo pelo shale-gas (gás de xisto) produzido nos Estados Unidos. O problema é que, para obter o gás ou até o petróleo de xisto, as empresas norte-americanas devem empregar uma técnica de extracção chamada “fracking”, que provoca verdadeiros desastres naturais, além de ter custos de produção altíssimos. Se a União Europeia vai escrever nas páginas do TTIP o fornecimento desse gás, será criado um precedente perigosíssimo, visto que, com a aceitação do “fracking”, vão cair todos os impedimentos e as leis ambientais para o corte indiscriminado das florestas, a destruição de montanhas e morros para abertura de minas e a retirada massiva de areias e cascalho pedroso dos rios. Além disso, com o TTIP, poderão ser liberalizadas todas as normas que limitam o uso exagerado dos aterros e dos lixões e que exigem uma funcionalidade específica para o tratamento dos resíduos orgânicos, tóxicos e de reciclagem.

5) Trabalho e Sindicatos

Como já foi dito pelo economista Josef Stiglitz, o trabalho é o capítulo que, nas negociações do TTIP, ocupa pouco espaço. Isso porque, nos países da União Europeia, a lógica do liberalismo conseguiu desqualificar a importância social e política do trabalho, para o reduzir a uma simples contagem de custos de produção/produtividade. Por exemplo, a nova lei italiana sobre o trabalho (Job Acts) se insere à perfeição na lógica do TTIP, do momento que seu cerne é a minimização dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

Todos os economistas que não estão comprometidos com as transnacionais admitem que, com esse acordo, haverá um geral rebaixamento das faixas salariais em todos os países da União Europeia, do momento em que os salários nos Estados Unidos são inferiores aos europeus. Além disso, também a maior parte dos direitos sindicais será revista e limitada e quem quiser contestar a filial de uma transnacional deverá ter muita paciência e, sobretudo, muitos dólares, visto que deverá accionar um Conselho de Arbitragem dos Estados Unidos. É preciso lembrar que o Congresso dos EUA aceitou ratificar somente duas das oito normas fixadas pela Organização Internacional do Trabalho (ILO) e, por isso, nos EUA, as empresas ganham quase todos os processos trabalhistas.

A dinâmica do TTIP não se limita a esses cinco capítulos, do momento que será desqualificada a maior parte das “normas não-tarifárias” que regulamentam o comércio dos produtos energéticos, químicos e farmacêuticos, censurando os elementos legislativos relacionados à implementação dos investimentos nesses sectores. De fato, não podemos esquecer que as transnacionais norte-americanas querem reproduzir no TTIP as normas aplicadas no ACTA (Anti-Counterfeiting Trade Agreement), que se relacionam com a propriedade intelectual. De fato, no ano passado, as mobilizações europeias em defesa da liberdade de expressão online e pelo respeito da privacidade conseguiram atrasar a assinatura desse tratado internacional sobre a propriedade intelectual.

Para concluir, resulta evidente que as “regras do livre mercado norte-americano ” que Barack Obama quer exportar aos países da União Europeia com o TTIP, na realidade, são uma grande ilegalidade metodológica. Hoje, a “excelência” do capitalismo mundial pretende nos obrigar a conviver com o rebaixamento dos padrões de qualidade, mesmo se isso implica mais riscos para a saúde e a conservação do ambiente. Querem anular os últimos direitos trabalhistas e nos submeter ao falso sonho de um mercado que resolve todos os problemas e pretende substituir a democracia.

Contestar hoje o TTIP não significa ser extremista. É, enfim, a justa maneira para contestar a nova tentativa dos Estados Unidos de impor a centralidade de um imperialismo arrogante e absolutista, no qual somente as multidões devaneadoras de Toni Negri ainda não repararam!

In Correio da Cidadania  

Achille Lollo é jornalista italiano, correspondente do Brasil de Fato em Itália, colunista do Correio da Cidadania e editor do programa TV “Quadrante Informativo”.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

A FORÇA «ÁRABE» DE DEFESA COMUM

A FORÇA «ÁRABE» DE DEFESA COMUM
 


Numerosos Estados, e personalidades, que haviam tomado posição no início da guerra do Iémene acabaram reconsiderando. Evitando posicionar-se automaticamente segundo a clivagem sunitas/xiitas, eles apelam ao cessar-fogo e a uma solução política. Por trás desta guerra inútil esconde-se, com efeito, o projecto de criação de uma Otan árabe… sob comando israelita.
 
Por Thierry Meyssan
 
Na sua Doutrina de Segurança Nacional, publicada a 6 de Fevereiro de 2015, o presidente Obama escreveu: «Uma estabilidade a longo prazo [no Médio- Oriente e Norte da África] requer mais que o uso e a presença de Forças militares norte-americanas . Ela exige parceiros que sejam capazes de se defender por si próprios. É por isso que investimos na capacidade de Israel, da Jordânia e dos nossos parceiros do Golfo em contrariar qualquer agressão, mantendo ao mesmo tempo o nosso compromisso inabalável com a segurança de Israel, nisso incluindo o seu progresso militar qualitativo» [1].

A leitura atenta do documento não deixa nenhuma dúvida. A estratégia do Pentágono consiste em criar uma versão moderna do Pacto de Bagdad, uma Otan árabe, de modo a poder retirar as suas forças militares do Médio-Oriente e Norte da África e a reposicioná-las no Extremo-Oriente (a «báscula» contra a China).

Do mesmo modo fica claro que, na sua visão, o Pentágono prevê que esta «Força árabe de Defesa comum» seja composta pelos Estados do Golfo e pela Jordânia, e que ela seja colocada sob comando israelita. Se retomarmos o exemplo do Pacto de Bagdad, recordaremos que ele fora constituído pelo Reino Unido com as suas antigas colónias. No entanto, ao fim de três anos, o seu estado-maior foi colocado sob o comando do Pentágono, muito embora os Estados Unidos não tenham jamais aderido ao Pacto.

Em Novembro de 2013, o então presidente israelita(israelense-br), Shimon Peres, interveio, por vídeo-conferência, perante o Conselho de Segurança do Golfo, reunido em Abu Dhabi na presença de representantes dos principais membros da Liga Árabe e de Estados sunitas da Ásia [2]. A sua intervenção, que incidiu sobre a necessidade de um novo pacto militar face ao Irão, foi longamente aplaudida.

O SIPRI, de Estocolmo, acaba de revelar que a Arábia Saudita estaria preparada para criar a «Força árabe de Defesa comum», aumentando o seu orçamento militar em 2014 para $ 13 biliões(bilhões-br) de dólares (+17%!).

Riade tenta envolver o maior número possível de Estados neste projecto. Conseguiu, pois, assim comprar a participação do Egipto. Para o conseguir, os Estados do Golfo ofereceram 12 biliões de dólares para os projectos de investimento do Cairo, aquando da conferência económica de Sharm el-Sheikh, a 13 de Março.

A Liga Árabe adoptou este projecto na sua cimeira em Sharm el-Sheikh, a 1 de Abril. Oficialmente, trata-se de aplicar o Tratado de Defesa árabe de 1950. Para lutar contra o terrorismo, a não ser que seja para satisfazer as ambições sauditas no Iémene. A guerra contra os Hutis(tas), da qual ninguém entende a necessidade, desempenha aqui o papel de um exercício em grande escala, sem que se manifeste compaixão pelo milhar de mortos e os 3.000 feridos que ela já provocou.

Desde já, segundo a Stratfor, o Estado-Maior da operação «Tempestade decisiva» não está na Arábia, mas, sim, na Somalilândia. Este país, que declarou a independência em 1960, foi depois unido à Somália na sequência de um golpe de Estado em 1969, proclamou pela segunda vez a sua independência em 1991, antes de ser reintegrado de novo na Somália, em 1994, e proclamou uma terceira vez a sua independência em 2002. Aquando das suas duas primeiras independências, Israel foi o primeiro estado a reconhecer a Somalilândia. Actualmente, este Estado não é reconhecido por ninguém, mas, desde 2010, é uma base israelita para controlar o estreito de Bab el-Mandeb, que liga o Canal de Suez e o Mar Vermelho ao Golfo de Áden e ao Oceano Índico.

Os chefes de Estado-maior da Liga Árabe vão reunir-se a 22 de Abril para avaliar as unidades que poderiam colocar à disposição deste dispositivo. O Egipto, o Koweit e Marrocos –o conjunto dos três implicados nos bombardeamentos ao Iémene— apresentarão um relatório preliminar, a 1 de Julho.

Tudo isto era, infelizmente, previsível. Depois de ter traído o Povo sírio, excluindo a República árabe da Síria das suas fileiras em violação dos seus estatutos, a Liga Árabe apresta-se para trair o Povo palestino, e para colocar os seus exércitos sob o comando de um Estado colonial.
 
 
In voltairenet.org
 


[1] National Security Strategy, (Ing-«Estratégia de Segurança Nacional»- ndT) White House, February 6, 2015. E o nosso comentário : “Obama rearma”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 9 de Fevereiro de 2015.

[2] “O presidente de Israel falou perante o Conselho de Segurança do Golfo em fins de novembro”, Tradução Alva, Rede Voltaire, 8 de Dezembro de 2013.
 

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