OS RESPONSÁVEIS POLÍTICOS PELO “ACORDO ORTOGRÁFICO” DE 1990
Análise dos factos políticos lesivos da Língua Portuguesa, por parte dos governantes e dos partidos, entre 1986 e 2014
Por Ivo Miguel Barroso
1. Em 2004, foi assinado um 2.º Protocolo Modificativo ao AO90 (“Acordo Ortográfico” de 1990) pelos 7 Estados. A ratificação deste Tratado foi uma prioridade do Governo seguinte, do PS, chefiado por JOSÉ SÓCRATES.
Em 2005, o Instituto Camões pediu vários Pareceres sobre o AO90 a especialistas e entidades. Os Pareceres foram todos negativos, sendo vários “arrasadores” (à excepção de um, subscrito por MALACA CASTELEIRO -em causa própria, pois fora um dos autores materiais do AO90 -, em nome da Academia das Ciências de Lisboa). Esses Pareceres não foram divulgados pelo Instituto Camões, senão em 2008.
Até à remodelação governamental que determinou a saída de ISABEL PIRES DE LIMA de Ministra da Cultura, a questão do AO90 foi analisada três vezes pelo Conselho de Ministros. A então Ministra da Cultura manifestou sempre a sua discordância em relação ao mesmo, juntamente com outros Ministros. Pode concluir-se que foi a oposição de ISABEL PIRES DE LIMA que impediu a ratificação do 2.º Protocolo Modificativo mais cedo.
2. Foi precisamente a partir da entrada em funções do novo titular da pasta da Cultura, JOSÉ ANTÓNIO PINTO RIBEIRO, no início de 2008, que o Governo de então decidiu acelerar o processo que, até então, havia sido “travado” pela ex-Ministra. Assim, o Governo, já após a remodelação, aprovou a Proposta de Resolução do 2.º Protocolo Modificativo em 6 de Março, a apresentar à Assembleia da República (AR).
3. No âmbito da sociedade civil, a “Petição / MANIFESTO em defesa da Língua Portuguesa contra o Acordo Ortográfico” (com ANTÓNIO EMILIANO, MARIA ALZIRA SEIXO, VASCO GRAÇA MOURA, e muitas outras personalidades) começou a recolher assinaturas em 2 de Maio. Em 8-5-2008, 12 dias antes da conclusão do processo, a Petição aludida fora já subscrita por 17.300 pessoas. Com esse número de assinaturas, recolhidas em tempo recorde de 6 dias, os Peticionários entregaram a Petição nos serviços da AR.
4. Na tribuna parlamentar, os discursos foram laudatórios do AO90: por parte do Ministro, JOSÉ ANTÓNIO PINTO RIBEIRO; seguido por Deputados. Apenas NUNO MELO discursou contra.
Não obstante a entrada da Petição e da opinião pública negativa por parte da sociedade civil (que, na altura, contava com Editores que, maioritariamente, estavam contra a ratificação), a AR veio a aprovar a Resolução n.º 35/2008, na votação final global; com votos a favor dos Deputados do PS, que tinha maioria absoluta e que impôs disciplina de voto (apesar disso, o Deputado MANUEL ALEGRE votou contra, quebrando essa disciplina de voto e apresentou uma declaração de voto), do PSD, do Bloco de Esquerda.
O grupo parlamentar do CDS teve liberdade de voto. Assim, 7 Deputados do CDS-PP votaram a favor. O líder, PAULO PORTAS, absteve-se, tal como JOSÉ CARVALHO e ABEL BAPTISTA. NUNO MELO e ANTÓNIO CARLOS MONTEIRO votaram contra. Também a Deputada LUÍSA MESQUITA (dissidente do PCP) votou contra. Os grupos parlamentares do PCP e do PEV abstiveram-se. Registaram-se também algumas ausências da votação.
5. O Presidente da República ratificou o 2.º Protocolo Modificativo em 29-7-2008.
6. Só na sessão legislativa seguinte a Petição-manifesto (Petição 495/X/3ª) recebeu tramitação na AR. Em 25-9-2008, decorreu a audição dos Peticionários. Em nosso entender, após a Petição ser admitida, houve violação do art. 13.º/1, da Lei n.º 43/90, não tendo curado de tramitar com “a máxima brevidade compatível com a complexidade do assunto”.
O Relatório final da Comissão Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura, elaborado pelo Deputado FELICIANO BARREIRAS DUARTE, apesar de favorável à Petição, foi aprovado muito tardiamente: 11 meses depois da entrada da Petição.
Ao todo, houve um total de 113.206 assinaturas da Petição-manifesto.
O debate em Plenário decorreu em 20-5-2009.
Para além desta Petição, foi apresentada uma outra Petição contra o AO90 (n.º 511/X (3.ª)), que, após a tramitação em sede de Comissão, foi apreciada em Plenário.
7. Do ponto de vista politológico, extraem-se as seguintes conclusões políticas:
i) Por via de regra, o Governo não se limitou a negociar e a assinar as convenções internacionais – teve um “peso” político na “união pessoal” existente entre o Primeiro-Ministro e o verdadeiro chefe da maioria parlamentar;
ii) Os Presidentes da República, das várias cores políticas (PS, MÁRIO SOARES (AO90), e JORGE SAMPAIO (1.º Protocolo, em 2000); PSD, CAVACO SILVA (2.º Protocolo, em 2008), deram sempre sequência à ratificação do AO, nunca tendo recusado nenhum acto de ratificação dos Tratados;
iii) No espectro político-partidário, historicamente, verifica-se que personalidades “históricas” do PS estiveram ligados à vinculação internacional de Portugal ao Tratado do AO:
- Quanto à versão originária do AO90: regista-se o voto maioritário em 1991, embora com voto contra de 16 Deputados do grupo parlamentar, quando havia uma maioria absoluta do grupo parlamentar do PSD; também, ao que apurámos, contou com os votos do PS.
A decisão final e discricionária de ratificação coube ao então Presidente da República, MÁRIO SOARES, que ratificou o AO90 em 1991. Porém, o AO90 contou apenas com três ratificações (de Cabo Verde e, em 1995, do Brasil), pelo que não chegou a entrar em vigor.
- Quanto ao 1.º Protocolo Modificativo, os titulares de cargos políticos filiados no PS “fizeram o pleno”: no 1º Governo de ANTÓNIO GUTERRES, através do Plenipotenciário, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, JAIME GAMA, assinou o 1.º Protocolo Modificativo; este foi aprovado pela AR, com votos a favor do grupo parlamentar do PS. O 1.º Protocolo foi ratificado pelo então PR, JORGE SAMPAIO (Decreto n.º 1/2000, de 28-1).
iv) A envolvência de órgãos dominados pela cor política do PSD é também significativa e convergente, tanto no início, como no fim: ou seja, no Tratado originário de 1990 (e, antes, no AO86) e na ratificação do 2.º Protocolo Modificativo.
O 1.º e o 2.º Governo maioritários, chefiados por CAVACO SILVA, deram o impulso para a assinatura e para a posterior ratificação da versão originária do Tratado do Acordo Ortográfico de 1990.
O 1.º e o 2.º Protocolos Modificativos foram aprovados pelo grupo parlamentar do PSD na Assembleia da República.
O 2.º Protocolo Modificativo foi ratificado pelo Presidente da República, CAVACO SILVA, curiosamente o mesmo titular que impulsionou a negociação do AO e a sua aprovação na AR.
7. O Governo minoritário do PS, a poucos meses da demissão, aprovou a Resolução em Conselho de Ministros n.º 8/2011, de 25 de Janeiro, que mandou aplicar o Acordo Ortográfico à Administração Pública e ao “Diário da República” a partir de 1 de Janeiro de 2012, bem como ao sistema de ensino, a partir de Setembro de 2011, antecipando o final do prazo de transição em praticamente 5 anos (!!).
8. Em 28-2 do corrente ano, decorreu a discussão da Petição em Plenário da Petição n.º 259/XII/2.ª (“Petição pela desvinculação de Portugal do Acordo Ortográfico de 1990”), que havia sido entregue em 26 de Abril por nós e por Madalena Homem Cardoso, tendo como 1.º subscritor Rui Miguel Duarte.
Face à iminente discussão em Plenário, foram apresentados 3 Projectos de Resolução: por Ribeiro e Castro, Michael Seufert e Mota Amaral; pelo BE; e pelo PCP (discussão em https://www.youtube.com/watch?v=FbjqSi-6az4; votação em http://www.youtube.com/watch?v=P2EPQeXAFJA). Apenas o tímido 1.º Projecto, que recomenda ao Governo a criação de um Grupo de Trabalho, sem prazo nem sanções, foi aprovado (Resolução da AR n.º 23/2014, de 17 de Março).
O resultado da Petição foi clarificador: todos os grupos parlamentares demonstraram-se “acordistas”, em maior ou menor medida, por esta ordem:
i) O PS é inequivocamente o Partido político com uma agenda mais “acordista”; ii) logo seguido do CDS (14 votos contra o Projecto minimalista de Ribeiro e Castro, e apenas 7 a favor, em contexto de “liberdade de voto”) e do PSD (que exigiu cortes no Projecto de Ribeiro e Castro, para que fosse aprovado; e que rejeitou sequer o cenário de suspensão do AO90, em reunião do grupo parlamentar, no dia 27-2); iii) a seguir, vem o BE (que admite entraves devidos a um possível recuo do Brasil); iv) o PEV; v) e, finalmente, o PCP (o único que, no Projecto de Resolução de 2014, admitia a desvinculação de Portugal do AO90, caso os restantes Estados não o estivessem a “aplicar”; e que se absteve nas anteriores votações do AO90 e das revisões do mesmo).
9. Em conclusão: as vias políticas para a resolução do cancro do AO90 encontram-se esgotadas: a AR, qualquer que seja a sua composição, sempre se manifestou a favor do AO90, em diversas sessões legislativas, tão díspares no tempo: 1991, 2000, 2008, 2009 e 2014.
No entanto, os estudos de opinião demonstram que os Portugueses são, com percentagens muito elevadas, contra o AO90; poucos a favor da revisão; e residualmente poucos a favor.
Ora, é mais fácil mudar de governantes, dissonantes com o eleitorado, do que mudar de povo. Daí o nosso apelo para que, nas eleições (europeias, parlamentares, presidenciais e autárquicas), as pessoas votem em listas/partidos e façam efectivar a responsabilidade política dos titulares de cargos políticos que se manifestaram a favor do AO90.
Apelamos a que os cidadãos não se abstenham, nem votem nulo ou em branco. A solução preferível para expressar o protesto (caso haja alguma escrita em “acordês” ou para expressar em geral o desacordo em relação ao AO90) é requerer que seja lavrado um protesto/reclamação, aquando do exercício do direito de voto, invocando o artigo 99.º da Lei Eleitoral da AR; protesto esse que tem de ser obrigatoriamente aceite pela Mesa de voto.
Apelamos também ao exercício do direito de resistência contra normas inconstitucionais (art. 21.º da Constituição) e dos demais mecanismos do Estado de Direito democrático.
Jurista
Publicado in “O Diabo”, 13 de Maio de 2014, pgs. 8-9
ResponderEliminarNão podemos aceitar que por interesses financeiros ou por ignorância destruam a etimologia da nossa Língua.
Yolanda Coutinho
Não podemos nem devemos aceitar nenhum acordo que destrua a Língua Portuguesa, que é a alma do Povo.
ResponderEliminarIgnóbil!
ResponderEliminarMalaca Casteleiro é sempre responsável por todos os atentados à língua portuguesa (veja-se também a TLEBS.
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