RICARDO COSTA - TELEGRAMAS DE UM RESGATE
É natural que qualquer pessoa que tenha
dinheiro no banco fique muito preocupada com o que se está a passar em
Chipre. A simples ideia de taxar por igual (embora progressivamente)
todos os que têm depósitos é absurda. Apesar dos recuos das últimas
horas - com os depósitos até 100 mil euros a poder ficar de fora ou ter
uma taxa baixa -, a ideia continua a ser absurda e perigosa, pela
absoluta quebra de confiança e pelo evidente perigo de contágio.
Mas, apesar de toda esta aparente loucura, há uma
"razão" para que tudo isto se tenha abatido sobre Chipre. O pequeno
Estado - que entrou na União Europeia por chantagem da Grécia - tem uma
economia assente numa praça financeira que esconde uma lavandaria de
dinheiro sujo, serve de domicílio fiscal a milhares de empresas que
beneficiam de um IRC muito baixo e de uma total ausência de
fiscalização.
A conjugação destes fatores e o facto de pertencer à UE
fizeram com que, de repente, os depósitos bancários em Chipre fossem
oito vezes maiores que a sua economia. Ter dinheiro em Chipre era ter
dinheiro na União Europeia, com baixos impostos e nenhuma fiscalização.
Os russos perceberam isso e passaram a usar Chipre como plataforma para
tudo, até para fazer chegar armas ilegalmente à Síria.
E o que é que isto tem a ver com Portugal? Pelo lado
dos depósitos, nada. Pelo lado da punição, quase tudo. A Alemanha - a
seis meses de eleições - mostra que não está disposta a facilitar a vida
aos que "prevaricaram". E desta vez Merkel tem o SPD do seu lado. Sim, o
candidato social-democrata apoia a punição a Chipre.
E é isso que deve preocupar os portugueses de forma
clara e distinta. Não são os nossos depósitos que estão em causa. São as
ideias de que vamos ter um caminho mais fácil para o ajustamento. Até
às eleições alemãs não haverá sinais disso, como a sétima avaliação da troika
mostrou. Depois logo se vê. A hora é ainda de punição. Não vale a pena
ir a correr ao banco. Mas vale a pena perceber que quem tomou a decisão
sobre Chipre são os mesmos que nos avaliam.
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