
Portugal, que conquistou a liberdade à custa de tanto sacrifício, não pode permitir que o seu destino se torne refém da raiva e da ignorância. O futuro não pertence aos que gritam mais alto, mas aos que sabem pensar — e resistir.
Por Paulo Ramires
André Ventura representa, na paisagem política portuguesa, a mais séria ameaça à democracia desde o 25 de Abril. A sua ascensão não resulta de um programa coerente, mas de um instinto: o de explorar o medo, a frustração e o ressentimento colectivos. Ventura não propõe uma visão de futuro — propõe um regresso ao salazarismo. O seu discurso, embrulhado em moralismo e demagogia, faz eco de um passado que Portugal julgava sepultado com o fim do Estado Novo.
O líder do Chega constrói a sua retórica sobre três pilares: a nostalgia autoritária, a simplificação do real e a manipulação emocional. Fala em “ordem”, “moral” e “mérito”, mas o que oferece é obediência, exclusão e ressentimento. Ao reivindicar a figura de Salazar — não apenas como símbolo, mas como modelo de governação — Ventura ultrapassa o limite do revisionismo histórico e entra no domínio da apologia. Pretende legitimar um regime que sobreviveu pela censura, pela repressão e pelo medo, como se a autoridade pudesse substituir a liberdade, e o silêncio, o pensamento.
A sua retórica quotidiana forçada pelos meios de comunicação social transforma a política num tribunal moral. Divide o país entre “os bons portugueses” e “os maus portugueses”, reduzindo a complexidade social a uma moral binária e inquisitorial. A cada problema responde com um culpado, os ciganos ou os imigrantes, indo ao ponto de colocar cartazes ofensivos para esses grupos sociais, cada dúvida, com um grito. É assim que o populismo se infiltra: oferecendo certezas onde deveria haver debate, punição onde deveria haver justiça, obediência onde deveria haver cidadania.
O discurso venturiano vive de uma falsificação sistemática da realidade. Distorce dados, generaliza comportamentos, alimenta preconceitos e transforma minorias em bodes expiatórios. A sua política é feita de ruído e ressentimento, de slogans que substituem ideias e de ataques pessoais que substituem argumentos. Em vez de promover e defender o diálogo democrático, Ventura alimenta a autoridade autocrática sustentando-se na própria democracia para subir ao poder — vai contra jornalistas, contra magistrados, contra quem não o aplaude.
A sua postura periga a democracia difundindo nos média que os apoia uma mensagem própria de um candidato autoritário que quer a todo o custo subir ao poder, o curioso é que os média sem noção serão uns dos primeiros a serem penalizados no médio e longo prazo, enquanto no curto prazo beneficiam com a polémica que puxa pela mediatização e faz subir audiências. Toda esta situação encontra alicerces nas massas ignaras, iletradas e sem noção do perigo que o país enfrenta.
Sob a aparência de uma cruzada moral, o Chega é uma máquina de indignação permanente. A sua força não reside na razão, mas no volume. E Ventura compreendeu que o ruído é o novo poder: quanto mais se fala dele, mais ele cresce; quanto mais se o confronta, mais se vitimiza. A política do escândalo tornou-se a sua estratégia, e o escândalo, o seu oxigénio.
Se tal projecto chegasse ao poder, Portugal conheceria o declínio lento e insidioso das liberdades. A crítica seria confundida com traição; a imprensa, silenciada sob o pretexto da “responsabilidade”; a cultura, sufocada por moralismo e censura. O pluralismo, essa conquista essencial da democracia, seria corroído pela imposição de uma verdade única, dita “patriótica” e para a impor Instalava-se a censura no cinema, nos livros, nas revistas, na internet e nas televisões.
O perigo de Ventura não é apenas o que diz — é o que normaliza. Ao reintroduzir no espaço público a linguagem do autoritarismo e ao vestir o ressentimento de patriotismo, arrasta o debate nacional para um terreno onde a razão perde e o medo vence. A sua ambição não é reformar o sistema, mas dominar a sua linguagem; não é fortalecer a democracia, mas submeter o país à lógica de um chefe autocrático.
Ventura não tem conhecimentos geopolíticos relevantes, reportando-se a apoiar os fanáticos, sionistas e fascistas de Israel, da Argentina e da América, fazendo alianças com os extremistas da União Europeia e prescindindo das alianças tão necessárias para Portugal de África e Brasil.
Portugal, que conquistou a liberdade à custa de tanto sacrifício, não pode permitir que o seu destino se torne refém da raiva e da ignorância. O futuro não pertence aos que gritam mais alto, mas aos que sabem pensar — e resistir.
RD
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